Acervo, Rio de Janeiro, v. 36, n. 3, set./dez. 2023

O arquivo como objeto: cultura escrita, poder e memória | Dossiê temático

Uma “documentação valiosa desordenadamente arquivada”

A mudança do Ministério das Relações Exteriores para Brasília e seu arquivo permanente

A “disorderly filed valuable documentation”: the move of the Ministério das Relações Exteriores [Ministry of Foreign Affairs] to Brasília and its permanent archive / Una “documentación valiosa archivada desordenadamente”: el traslado del Ministério das Relações Exteriores [Ministerio de Relaciones Exteriores] a Brasilia y su archivo permanente

Rogério de Souza Farias

Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB). Professor do Programa de Pós-Graduação em Relações Internacionais e pesquisador sênior do Centro de Estudos Globais da UnB, Brasil. 

rofarias@gmail.com

Fernando Sousa Leite

Doutorando e mestre em História pela Universidade de Brasília (UnB). Diplomata do Ministério das Relações Exteriores, Brasil.

sousaleite.fernando@gmail.com

Resumo

Este artigo apresenta a gênese da unidade de Brasília do Arquivo Histórico do Itamaraty. Para entender aspectos centrais da constituição de seus fundos, argumenta-se ser relevante a compreensão da herança do funcionamento do órgão no Rio de Janeiro até 1970 e as consequências das restrições da ditadura militar.

Palavras-chaves: diplomacia; Arquivo Histórico do Itamaraty; Brasília.

Abstract

This article presents the genesis of the Brasília’s unit of Itamaraty’s Historical Archive. It argues that to understand the constitution of its funds it is essential grasp the legacy of Itamaraty’s activities in Rio de Janeiro until 1970 and the consequences of restrictions imposed during the military dictatorship.

Keywords: diplomacy; Itamaraty’s Historical Archive; Brasília.

Resumen

Este artículo presenta la génesis de la unidad de Brasilia del Archivo Histórico de Itamaraty. Argumenta que para entender la constitución de sus fondos es imprescindible comprender el legado de las actividades del Itamaraty en Río de Janeiro hasta 1970 y las consecuencias de las restricciones impuestas durante la dictadura militar.

Palabras clave: diplomacia; Archivo Histórico de Itamaraty; Brasília.

Em março de 1970, no auge do período repressivo da ditadura (1964-1985), um grupo de militares executou uma operação planejada por vários meses. O destacamento, integrado por um tenente, um sargento e oito soldados, supervisionou o carregamento de três caminhões na sede do Ministério das Relações Exteriores (Itamaraty), no Rio de Janeiro, e depois acompanhou o transporte por vários dias, em trajeto com pernoites em quartéis em Minas Gerais, até a chegada à Esplanada dos Ministérios, em Brasília.1 Somente em abril de 1970 o Itamaraty formalmente instalou sua sede na cidade, apesar de a nova capital ter sido inaugurada em 1960. A carga do comboio era parte desse processo: o acervo da Seção Antecedentes do arquivo, que se juntaria a outros acervos essenciais para o funcionamento cotidiano da instituição.

Essa mudança assinalou rupturas e inovações, sendo o passo inicial na constituição da atual unidade de Brasília do Arquivo do Itamaraty, instância com um dos maiores e mais relevantes acervos arquivísticos sobre a história política do Brasil no século XX. O objetivo deste artigo é apresentar o processo de construção normativo e material do Arquivo do Itamaraty em Brasília, apontando como relevantes nessa dinâmica a interação entre cultura institucional e pressões externas, além da experiência da unidade no Rio de Janeiro entre as décadas de 1930 e 1960. Como os soldados que fizeram a escolta do material deixam claro, um elemento explicativo central foi o contexto da política doméstica, que influenciou significativamente a organização e o acesso ao acervo.

Um elemento fundamental é o argumento de inexistência do “Arquivo do Itamaraty” como entidade unificada do ponto de vista administrativo. Adicionalmente, será defendida a tese de que é enganosa a concepção do ano de 1960 como divisor cronológico dos fundos do Rio de Janeiro e de Brasília – algo apontado na literatura desde 1999 (Penna Filho, 1999, p. 117-118). A novidade, aqui, será identificar o que explica a distância entre a intenção de usar tal data como corte e a realidade do acervo da capital federal.

O trabalho é dividido em quatro partes, além da introdução e da conclusão. A primeira trata da natureza específica da informação e do arquivo para a atividade diplomática, em especial no Brasil no início do século XIX. A segunda, mais longa, volta-se à compreensão do período de profissionalização arquivística, entre os anos 1920 e 1960, com a efetiva separação do acervo corrente daquele permanente, nos termos da nomenclatura atual do ciclo de vida dos documentos, ao qual foi concedido acesso, ainda que limitado. Foi, ademais, período no qual se criaram rotinas de produção de informação e de preservação, algo com grande efeito na mudança para Brasília. A parte seguinte lida com o processo de mudança em si e a efetiva divisão do acervo institucional entre Rio de Janeiro e Brasília.

Antes de continuar, é pertinente apresentar alguns elementos de caráter metodológico e temático. Primeiro, o artigo tem caráter eminentemente empírico e narrativo. Sua preocupação é, sobretudo, sistematizar informações dispersas em fontes primárias inéditas. A maioria foi coletada nas dependências do Arquivo do Itamaraty em Brasília, denominado aqui de unidade de Brasília do Arquivo Histórico do Itamaraty (AHI-BSB), apesar de não ter oficialmente esse nome. Segundo, em decorrência desse acervo ainda não estar plenamente organizado, buscou-se utilizar a nomenclatura provisória, algumas vezes usando-se a localização topográfica de maços e caixas. Tanto a legislação quanto as circulares do Itamaraty são apresentadas sem fontes, pois eram publicadas, de forma geral, no Diário Oficial da União. Por fim, há a questão do anacronismo. Grande parte do esforço de análise é voltado para a compreensão da interação entre unidades que tratavam de acervos hoje denominados correntes, intermediários e permanentes.2 Deve-se levar em conta, no entanto, que, a despeito dos conceitos serem usados ao longo do texto, eles não eram utilizados à época.

Origem

No fim de 1807, toda cúpula administrativa portuguesa navegava no Atlântico em direção ao Brasil como forma de sobrevivência do Estado diante da invasão francesa. Além das centenas de nobres, burocratas e militares, no navio Meduza, uma embarcação da frota, havia uma carga especial: o acervo da pasta dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, com centenas de documentos essenciais para a condução cotidiana das funções estatais (Manchester, 1968, p. 24-26; Meirelles, 2008, p. 63-71; Pereira, 1953, p. 183-185). O arquivo da pasta, nesse contexto, definiu a natureza material e simbólica do próprio Estado português.

Essa não foi uma realidade particular ao país. O nascimento do moderno sistema internacional e a progressiva criação de burocracias especializadas levaram, em muitos Estados, no século XVII, à consolidação de uma unidade específica para tratar de problemas diplomáticos. O exemplo mais sofisticado desse processo ocorreu na França de Luís XIV, quando foram profissionalizados os processos de produção, circulação, arquivamento e consulta de informação. Os suportes contendo tratados, mapas, comunicação com potências estrangeiras e relatos sobre acontecimentos distantes ajudaram a constituir o cerne do Estado francês, em sua definição de limites territoriais e de autorreferência sobre identidade nacional e interesses internacionais. Assim, o arquivo diplomático foi considerado, ao mesmo tempo, instrumento de trabalho cotidiano e referência de poder, especialmente diante de instituições rivais (Bourdieu, 2014, p. 162-175; Rule; Trotter, 2014).

O arquivo é atributo simbólico da soberania. Foi natural, portanto, que, quando d. João VI decidiu voltar para a Europa, instruiu especificamente que o acervo retornasse com ele. A ordem não foi seguida, o que pode ser considerado um dos primeiros sinais de autonomia de um aparelho administrativo embrionário. O acervo em sua quase totalidade permaneceria no Brasil, constituindo a base inicial do arquivo da nova pasta de Negócios Estrangeiros (Ferreira, 1943).3

No Império e no início do período republicano, o arquivo foi instrumento fundamental de trabalho, em decorrência das questões de fronteiras com os vizinhos e das negociações diplomáticas envolvendo repetidos conflitos interfronteiriços, particularmente no Cone Sul. Mesmo documentos considerados antigos já naquela época tinham importância, como os relatos portugueses das Conferências de Utrecht (1712-1713), pois tratavam de definições territoriais ainda não concluídas.4

Não se pode dizer que esse acervo tenha sempre recebido o melhor tratamento. As mudanças do endereço físico da pasta dos Negócios Estrangeiros e, posteriormente, das Relações Exteriores, ocasionaram desorganização e até perda de maços, caixas e pastas. Entre 1822 e 1899, foram pelo menos cinco endereços distintos (Serrano, 1994). Na mudança do Palacete Bahia, na rua da Glória, para o Palácio Itamaraty, na avenida Marechal Floriano n. 196, endereço no qual permaneceu até a transferência para Brasília, “conta-se mesmo que, na mudança, em caminhões dos bombeiros, a papelada veio para o Itamaraty de tal modo que, na Lapa, a ronda da cavalaria deteve um desses, para se arrebanhar o que de papéis estava a cair pela rua afora” (Vasconcellos, 1930, p. 246).

No início do século XX, o reflexo dessa atribulada mudança ainda se fazia sentir. O barão do Rio Branco, ao assumir a pasta das Relações Exteriores (1902), teria notado que o arquivo estava em um “desvão térreo de uma escada de serviço, na ala chamada velha do palácio, sem nenhuma espécie de arrumação”, aos cuidados de um contínuo. A situação era claramente inadequada, mas não faltavam jovens pleiteando posições para colaborar, muitos dos quais com excelentes padrinhos. Mesmo no órgão, em posição subalternas, havia potenciais interessados. O barão, no entanto, preferiu entrar em contato com seus amigos José Veríssimo e Capistrano de Abreu, pois desejava um profissional com mais experiência na organização de acervos. Eles lhe indicaram Antônio Jansen do Paço, o chefe de serviço da Biblioteca Nacional, e Mário de Vasconcelos, seu subordinado (Lyra, 1972 [1922], p. 10-11). Foi o início da profissionalização do setor, situação que perdurou até a mudança para Brasília.

Paço chefiou o arquivo até 1914, sendo sucedido por Vasconcelos, que permaneceu até 1918. A liderança seguinte, Napoleão Reis, foi a mais longeva, atuando de 1918 a 1934. Apesar de todos terem se esforçado, alcançaram resultados limitados. Paço, por exemplo, nunca teve funcionários suficientes para executar seus planos e acumulou outras funções. Também não ajudou o fato de o arquivo mudar constantemente de posição no organograma do órgão. Na gestão do barão do Rio Branco, vinculava-se diretamente ao gabinete do ministro, o que lhe dava certo prestígio. Durante a Primeira Guerra Mundial, foi transferido para a Diretoria-Geral de Contabilidade e de Administração; no início da década de 1920, estava na Diretoria-Geral de Negócios Comerciais e Consulares.5

A melhor descrição do estado do setor no fim desse ciclo é a de Otávio Mangabeira, no relatório de 1926:

O arquivo, desprovido, a bem dizer, de qualquer organização, nem sequer se acha instalado em condições toleráveis. São papéis acumulados, às vezes sem ordem alguma, em estantes de madeira, e até por cima de mesas, conjunto de mau aspecto, em salas parede-meia com casas de habitação particular. (Brasil, 1927, XIX)

Era impossível conduzir qualquer pesquisa. Sensibilizado por essa situação, Mangabeira iniciou o maior programa de reestruturação do setor no século XX. A providência inicial foi a construção de um edifício próprio para a biblioteca, o arquivo e a mapoteca. Previu-se armazém para sessenta mil volumes, instalações para dois mil metros lineares de arquivos e depósito para vinte mil mapas. A construção foi uma oportunidade para implementar uma série de medidas.

A mais importante foi o recolhimento dos arquivos pulverizados na Secretaria de Estado e, principalmente, de embaixadas, legações e consulados ao redor do mundo.6 O objetivo era completar séries históricas e agregar coleções perdidas, mas o material encaminhado já foi suficiente para deixar toda a nova casa-forte do arquivo em completa desordem. Havia, ao final do processo, quatro coleções distintas: 1) arquivos parciais das 12 seções da Secretaria de Estado, agora reunidas no Arquivo Central; 2) o arquivo geral, com documentos desde o período colonial; 3) o arquivo das missões diplomáticas; 4) o arquivo dos consulados. Nesse contexto, decidiu-se deixar no “Arquivo Central” documentos com data posterior a 1926, e os de anos anteriores seriam encaminhados para o “Arquivo Geral”. A segunda fase era reunir os dois arquivos no “Arquivo Único”.

O processo de inauguração das novas dependências coincidiu com uma reforma profunda do Itamaraty. Eliminou-se a carreira da Secretaria de Estado, reunindo-a à consular e à diplomática. Isso teve efeito sobre o processo de circulação e arquivamento de expedientes. Até então, o arquivo corrente era depositado nas seções do órgão. Tudo dependia das regras informais criadas e mantidas pelas chefias. Até janeiro de 1931, isso era relativamente fácil, pois o quadro de servidores era estável. Para se ter ideia, em 1929, dos oito diretores de seção, cinco haviam começado a trabalhar no órgão antes da gestão Rio Branco. Desses mesmos oito, cinco ocupavam os respectivos cargos há mais de uma década.7 Como afirmou Luiz Fernandes Pinheiro, “pela memória, ou porque cuidassem os mais zelosos de fazerem prontuários para uso próprio, o fato é que os mais velhos e mais capazes [...] eram valiosos cabedais de precedentes, que tanto valiam por si como também porque transmitiam às gerações mais novas o que sabiam”.8

O fim da carreira de Secretaria de Estado eliminou essa espinha dorsal. Inexistiria um quadro permanente e fixo no Rio de Janeiro para o conhecimento individualizado ser repassado a novas gerações. A constante rotação de quadros exigiu um sistema que independesse de iniciativas pessoais, e fosse rapidamente apreendido pelos servidores novos. Foi nesse contexto que se deu início à organização de um “índice de classificação de precedentes”, inspirado no método Dewey, que redundaria no manual de classificação decimal, iniciado em 1927 e só concluído em 1934 (Brasil, 1929, p. 87). Para uma observadora, a medida teve “a grande vantagem de unificar o critério para a classificação, extinguindo as organizações pessoais, à vontade do encarregado de cada arquivo”.9

A rotina de reformas foi acelerada com a Revolução de 1930. Afrânio de Melo Franco, o novo ministro das Relações Exteriores, criou, em 14 de julho de 1931, o “serviço de intensificação e reorganização do arquivo” e, em 21 de setembro de 1931, subordinou o arquivo ao seu gabinete de forma temporária, até a conclusão do processo. Os resultados foram positivos. A remoção de papéis e documentos do velho arquivo permitiu “redescobrir”, entre outros materiais, o rico acervo de memórias redigidas pelo barão de Ponte Ribeiro sobre as fronteiras brasileiras.10

Nesse período reformista, pesquisou-se a possibilidade de refrigerar os armazéns de livro, de originais e de documentos históricos. Também se iniciou aqui um programa de trabalho para organizar e revisar inventários de todos os documentos até 1930 por fundos, conferir as segundas vias de correspondências diplomáticas anteriores a 1930, iniciar a organização das coleções “diversos (no interior e no exterior)” e definir arranjos específicos para arquivos particulares – somente o do Rio Branco havia sido concluído.11

Esse salto qualitativo foi possível por intermédio da contratação de dezenas de servidores em carreiras novas, que se especializaram ou em períodos ou em temas do manual de classificação. Uma observadora relatou o ambiente: “A nova concepção do arquivo é inteiramente oposta à antiga – de um departamento morto, onde se alojavam papéis velhos, passa ele a ser um organismo vivo, central, por onde passam todos os papéis, mal entram no ministério, a fim de serem anexados aos precedentes ou antecedentes relativos ao caso.”12

O Arquivo do Itamaraty, nesse período, foi considerado modelo, sendo recorrente a visita de estrangeiros e nacionais e o estágio de servidores de outros órgãos. Contudo, não houve preocupação sistemática com o que hoje se denomina de tabela de temporalidade, com definição de tempo de guarda, destinação final e política de eliminação. Isso levou a um problema que existiria de forma constante nas décadas seguintes, particularmente em Brasília: a eliminação aleatória de documentos, especialmente de anexos de expedientes, sem apoio legal ou orientação de outras instâncias governamentais. Algumas das séries eliminadas, como cifrações, não eram relevantes para o pesquisador futuro. A incineração dos telegramas particulares recebidos de 1932 a 1936, no entanto, eliminou grande parte dos bastidores da história da política externa do período.13

Essa carência de sistematização foi sintoma de problemas mais profundos sobre o que se considerava arquivos correntes, intermediários e permanentes – terminologia empregada atualmente, mas inexistente na época. Com a construção do prédio, foram realizadas várias definições de anos de corte, priorizando o acervo de uso cotidiano em detrimento dos demais. Assim, apesar de toda a pompa, em 1933, todo o acervo do “velho arquivo” (também denominado de “arquivo antigo”), com documentação do século XVIII até 1926, estava a cargo de um só servidor, o dedicado servente Manuel Miranda.14 Em 1938, ainda estava quase todo desorganizado – somente quinhentos volumes encadernados, o que era “uma gota d’água no oceano de papéis”, segundo um servidor.15

Essa divisão entre dois acervos distintos tomou forma definitiva em 1942, por pressão do Departamento Administrativo do Serviço Público (Dasp).16 Segmentou-se, então, o arquivo de consulta daquele considerado histórico, com o primeiro integrado ao Serviço de Comunicações e o segundo, ao Serviço de Documentação.17 Essa fratura entre “arquivo vivo” e “arquivo histórico” precedeu a transferência para Brasília e iniciaria as confusões relativas ao acervo. A implementação não foi fácil. Mário de Saint Brisson, chefe da administração em 1943, apontou a dificuldade de um corte, mas indicou que, naquele momento, todo o acervo de documentos até 1930 seria considerado histórico, sendo denominado de consulta todos os documentos de anos posteriores. Havia, naturalmente, exceções, como os maços pessoais, considerados como de consulta; tampouco seriam divididos os maços de assunto.18 A partir desse momento, existiriam três núcleos de acervo – o Arquivo Histórico, o Arquivo Geral e o Arquivo de Correspondência Especial (para documentação classificada), com várias séries documentais presentes nos três.19

A permanência dessa divisão em contexto de fluidez com relação à data de corte para a transferência da documentação para o Arquivo Histórico ensejou muitos questionamentos. A circular n. 619, de 13 de dezembro de 1948, por exemplo, indicou que essa decisão cabia somente às chefias e deveria ser executada lançando-se dois traços paralelos à margem esquerda do documento, com a respectiva rubrica e a data da ordem. Isso, no entanto, direcionava o documento para o arquivo, e não impedia erros e tampouco oferecia critério mais objetivo para a migração para o Arquivo Histórico. Ocasionalmente, vigias e faxineiros encontravam maços nos locais mais inusitados do órgão, alguns de caráter reservado.20

Acesso a pesquisadores

Em meados da década de 1950, já havia uma separação entre os maços que hoje seriam denominados de correntes e intermediários daqueles considerados permanentes. A primeira categoria abrangia cinco seções – originais, antecedentes, classificação, correspondência e Arquivo Geral.21 Essas unidades são referências até os dias de hoje para a organização do acervo em Brasília. Elas, no entanto, eram distintas do denominado Arquivo Histórico, até pela vinculação administrativa – as primeiras, com o tempo, seriam vinculadas ao arquivo da Divisão de Comunicação e Arquivo (DCA), enquanto o Arquivo Histórico estava subordinado ao Serviço de Documentação.

Os termos são hoje condenados pela arquivologia, mas a divisão refletia a ruptura entre o Arquivo Histórico e as unidades com acervo corrente. O primeiro aspecto a salientar nesse contexto é a dimensão de pessoal. De 1937 a 1955, o arquivo corrente manteve-se com o mesmo número de servidores (33), a despeito do aumento considerável do serviço.22 A crítica à falta de servidores seria litania recorrente dos chefes da área, com ocasionais melhorias. Geralmente, iniciava-se um ciclo em que o baixo número de servidores após vários anos levava à contratação de arquivistas, arquivologistas e pessoal de apoio. E eles, após a contratação, não demoravam para serem transferidos para outros setores da Secretaria de Estado – também sempre demandantes de mão de obra –, o que ensejava o reinício do ciclo. O Arquivo Histórico foi o que mais sofreu com a carência de pessoal. Tendo contado com nove servidores, em 1951 tinha somente três.23 A carência de técnicos especializados ensejou decisões administrativas que se repetiriam nas próximas décadas – a “promoção”, ou melhor, o desvio de função de servidores de apoio para o arquivo. Em 1959, por exemplo, no salão de maços de antecedentes, três mensageiros foram designados para serem encarregados de classificação.24

A carência de espaço para o arquivo corrente foi outro fator preocupante. Quando as instalações foram inauguradas, em 1930, havia cerca de dez mil maços; em meados da década de 1950, o espaço permanecera o mesmo, mas a documentação multiplicou-se por dez.25 Em 1953, havia impossibilidade real de o órgão funcionar se não fosse executada uma medida drástica. Assim como muitas vezes na década seguinte, a solução foi contornar o problema. Como medida extrema, mudou-se a posição dos armários, colocando-os paralelos ao corredor e, assim, conseguindo espremer mais estruturas.26

O fluxo da encadernação dos volumes da seção de originais também ajudou na otimização do espaço. Em 1959, foram transferidos 1.813 volumes para o Arquivo Histórico, referentes ao período de 1931 a 1939. Essa medida, de cunho administrativo, teve grande repercussão, pois redefinia o que se considerava “histórico” como separado do arquivo corrente. Em outros casos, a migração para o Arquivo Histórico era mais caótica. Em 1962, foram jogados ao lado da porta da Seção de Expedição, perto da escada de serviço com acesso à Mapoteca, os documentos do acervo dos extintos Escritórios de Expansão e Propaganda Comercial. Eles permaneceram por mais de um ano nessa situação.27

Em 1931, as consultas externas eram tão diminutas que não mereciam registro no relatório de uma das seções do órgão.28 Isso decorreu da própria cultura organizacional e das regras internas da instituição. O Regimento Interno da Secretaria de Estado de 1943 (decreto n. 12.343, de 5 de maio de 1943), no entanto, determinou que a consulta de “estranhos” ao recém-criado Arquivo Histórico seria concedida pelo ministro de Estado para documentos anteriores a 1850, tendo sido aberta exceção alguns anos depois para assuntos não americanos até a Proclamação da República. Somente com autorização da cúpula do órgão, portanto, seria possível franquear o acesso a pesquisadores externos (Brasil, 1948, p. 125).

Uma transformação desse quadro veio com o progressivo aumento de relevância da Comissão de Estudos dos Textos da História do Brasil (CETHB), criada em 13 de abril de 1943, inicialmente com 12 membros e três auxiliares, diplomatas e pesquisadores. Nas décadas seguintes, a CETHB reuniu a nata dos historiadores brasileiros, entre eles Hélio Viana, José Honório Rodrigues, Américo Jacobina Lacombe, José Antônio Soares de Souza, Pedro Freire Ribeiro, Artur César Ferreira Reis e Enéas Martins Filho.

Os membros da comissão, ao oferecerem cartas de recomendações, tinham papel fundamental na intermediação entre pesquisadores e o Arquivo Histórico. Sabemos, no entanto, que existiam regras não escritas. Uma delas era a proibição informal ao acesso aos arquivos particulares aos estrangeiros e, mesmo para brasileiros, muitas coleções continuavam fechadas – como a do visconde do Rio Branco, pelo menos até meados da década de 1950.

Indivíduos vinculados a algumas instituições tinham maiores facilidades de consulta – como os alunos da Escola Superior de Guerra (ESG). Mesmo nesse caso, contudo, havia, na década de 1950, certo rigor em não permitir a leitura de expedientes confidenciais e secretos. O manual de serviço em vigor indicava que somente tinham acesso ao Arquivo de Correspondência Especial os chefes de divisão e substitutos, os chefes de departamento e auxiliares, o secretário-geral e seus auxiliares e os oficiais de gabinete do ministro de Estado. Foi somente em maio de 1957, por iniciativa do chefe do Arquivo, que se utilizou o caso dos estudantes da ESG para abrir uma exceção ao acervo de confidenciais. 29

Os membros da CETHB atuavam em colaboração com a chefe do Arquivo Histórico, Constança Wright, cujos olhos zelosos desde 1944 perscrutavam as intenções dos pesquisadores. A análise, por vezes, como no exemplo do historiador paraguaio Antônio Ramos, identificava se o requerente tinha obra tendenciosa contra o Brasil; mas se fosse “historiador honesto”, como foi considerado o caso, era recomendado o franqueamento à consulta. Nessa situação específica, porém, Wright chocou-se com a recomendação da CETHB, indicando que os arquivos dos países vizinhos “sempre têm feito restrições nas pesquisas de brasileiros”. Ela adicionou uma nota interessante sobre seus superiores, todos diplomatas de carreira: “Os antecedentes sempre têm sido os mais variados, de acordo com o conceito das autoridades no momento. [Há] umas que acham que a verdade histórica deve prevalecer (portanto franquear tudo); há outras que acham que só se deve facilitar a correspondência ostensiva”.30

Era uma percepção correta, pois havia disputa na definição das regras de acesso, com constantes violações do manual de serviço tanto para a liberação como para o fechamento. Muitas vezes o acervo liberado era, alguns anos depois, fechado, em confusão que exasperava pesquisadores. Essa situação era particularmente grave nos assuntos relacionados ao Prata, em especial à Guerra do Paraguai. Em embate com a mesma Constança Wright, o diplomata e historiador Heitor Lyra escreveu: “D. Constança, deixa o homem fazer história! Mais insultuosa do que essas cartas foi a guerra que fizemos a Uribe e a Rosas, insultuosas no sentido de aniquilá-los. Pois, se eram nossos inimigos, o que queria a senhora que disséssemos? Deixe o homem fazer história como entender”.31 Na mesma época, o diplomata Henrique de Souza Gomes apresentou opinião diversa. Para ele, a divulgação de documentos, mesmo aqueles referentes ao início do século XIX, podia, indiretamente, “vir a prejudicar as boas relações de amizade” do Brasil, em especial aquelas relacionadas à bacia do Prata.32

Mesmo assim, foi sobretudo pela pressão de pesquisadores estrangeiros aliados aos historiadores vinculados ao CETHB que se alcançaram alguns avanços. Em 1965, em decorrência da consulta de um pesquisador estrangeiro (Richard Brunn), iniciou-se revisão das regras de acesso, resultando no decreto n. 56.820, de 1° de setembro de 1965, que estendeu o limite da consulta “livre” para 1900, com possibilidade de acesso até 1918 se esta fosse sobre assuntos relativos às relações do Brasil com países não americanos. A implementação do novo normativo continuou a ser impactada pela ação excessivamente zelosa de servidores. A liberação para consulta, mesmo para documentos já oficialmente acessíveis pela nova norma, era comumente bloqueada. Convém examinar um caso emblemático: o pedido do professor Uacury Ribeiro de Assis Bastos para ter acesso ao acervo pessoal do diplomata Duarte da Ponte Ribeiro.

A questão foi apreciada em 34 despachos por mais de dez servidores e perdurou de 28 de julho de 1966 a 22 de outubro de 1967. Tudo se iniciou com a apreciação da arquivista Constança Wright. Ela avaliou que, mesmo em tese acessível pela legislação, o assunto era “delicado”. O escritor e diplomata João Guimarães Rosa, na época chefe do Serviço de Demarcação de Fronteiras, após avaliar o material, julgou “altamente inconveniente” o acesso externo a muitos documentos. Já o diplomata Luiz Cláudio Pereira Cardoso discordou, apontando que, a despeito de muitos documentos não serem lisonjeiros ao Brasil, não via razão para a interdição. Notou, contudo, que Assis Bastos era “simpatizante da posição paraguaia no litígio de fronteira com o Brasil”. A questão, então, foi para Espedito de Freitas Resende, chefe da Divisão da América Meridional. Por um lado, ele apontou a necessidade de evitar “interpretações menos retas”, propensas a “gerar polêmicas ou aumentar ressentimentos” dos países vizinhos, por outro, indicou preocupação com a repercussão da negativa, optando, por fim, pela recomendação do acesso a quase todo o material. A orientação foi recusada por seu chefe, Manuel de Pimentel Brandão, sob o argumento de o ineditismo exigir que os primeiros especialistas a consultar os documentos tivessem opinião mais convergente com a posição oficial do governo brasileiro. Diante de tantos conflitos, a questão foi encaminhada para a CETHB, para que um de seus historiadores arbitrasse documentos específicos. O historiador Pedro Freire Ribeiro apreciou a questão e recomendou o livre acesso aos documentos, o que foi cumprido.33

Essa atuação da CETHB era conduzida sem qualquer instrução para balizar o processo de avaliação. Foi, no entanto, esforço que sinalizou ambiente mais receptivo aos historiadores. A mudança para Brasília e o contexto mais autoritário da ditadura militar ao final da década de 1960 reverteriam esses avanços.

Preparação e mudança

Brasília foi inaugurada em 21 de abril de 1960. Na ocasião, o Itamaraty contava só com um pequeno espaço nas dependências do Ministério da Saúde. Foi somente uma década depois que o órgão oficialmente migrou para o chamado Palácio dos Arcos, na Esplanada dos Ministérios. Esse interregno de uma década foi significativo por seus silêncios e decisões, e teria consequências por décadas na gestão dos acervos da instituição.

O trabalho produzido em 1958 por Renato de Almeida, chefe do Serviço de Documentação, serviu como orientação presciente. Em sua opinião, as várias áreas do órgão custodiavam acervo histórico e material raro que poderia permanecer no Rio de Janeiro ou ser transferido posteriormente. Isso envolvia o acervo de cimélios da Biblioteca e a coleção de cartas e mapas antigos. Sobre o Arquivo Histórico, recomendou que fosse o último a ser transferido.34 Havia, portanto, grande ambivalência sobre o que fazer na área.

Também era problemática a contínua falta de diálogo entre os setores do órgão. A equipe responsável pela nova estrutura de Brasília não informava com presteza os andamentos dos trabalhos. Em abril de 1965, o chefe da Divisão de Comunicações e Arquivo teve de solicitar explicitamente a especificação da metragem das salas do edifício do órgão em Brasília e somente em 1967 o responsável pela Comissão de Transferência convocou servidores a Brasília para discutir a localização do arquivo.35

Essas discussões sobre a estrutura espacial para os acervos na nova capital eram cruciais. No início da década de 1960, cogitou-se que o anexo II do órgão fosse reservado à Biblioteca, Mapoteca, Microfilmagem, Arquivos, Serviço gráfico e Publicações. Isso permitiria o deslocamento de todo o material, inclusive o Arquivo Histórico, para a cidade. Mas esse prédio só teve a construção concluída no fim da década de 1980.36 Isso demandou remanejamento do espaço do acervo dentro da estrutura do anexo I, prédio verdadeiramente administrativo, pois o palácio servia preponderantemente para funções cerimoniais e para os gabinetes do ministro de Estado e do secretário-geral.

Talvez por isso não seja possível identificar planejamento por parte do Arquivo Histórico para uma migração para Brasília, o que nos leva a crer na possibilidade de os servidores da área já trabalharem para a permanência do acervo no Rio de Janeiro. A hipótese parece confirmada pelo relatório de desligamento de Constança Wright, de 1967, referente à última reunião dos chefes de documentação de que participou, em que foi definida a não remoção para Brasília dos acervos mais antigos do órgão.37 Essa é uma situação diversa da que passava a Biblioteca, que já contava com uma planta com o aproveitamento da área que seria utilizada em Brasília.38

Se o Arquivo Histórico caminhava para permanecer no Rio de Janeiro, o planejamento para os setores correntes e intermediários do arquivo logo acelerou-se. Em julho de 1969, já tinham sido preparados para a mudança 50% dos volumes da Seção de Originais. Na Seção de Correspondência Especial, a mais sensível do ponto de vista de classificação, 80% do acervo já estavam embalados.39 Em agosto de 1969, a circular n. 8.207 determinou que todo expediente enviado do exterior, a partir de 1o de outubro, fosse encaminhado concomitantemente para o Rio de Janeiro e para Brasília. A instituição, no que se refere ao acervo corrente, dava os últimos passos para a mudança.

A transferência do acervo foi realizada para Brasília sobretudo pela via rodoviária.40 Essa, contudo, não foi uma regra geral. Alguns fundos classificados como reservados, confidenciais e secretos foram priorizados para serem expedidos por via aérea. Priorizou-se o acervo dos departamentos, divisões e serviços para também seguir por avião.41

Os relatos sobre o processo de mudança são bastante fragmentados, havendo variações de acordo com a área. Quase todas as seções da Divisão do Arquivo ocupavam salas do sexto ao oitavo andar do anexo I. A Seção de Antecedentes inicialmente trouxe dez mil maços, muitos dos quais do período anterior a 1960. De acordo com a primeira encarregada da área em Brasília, o material chegou “na mais completa desordem”, com grande parte ainda no Rio de Janeiro. Não haviam sido entregues os armários e as estantes. Assim, quando chegaram os cinquenta caixotes iniciais, eles ficaram empilhados sobre 32 mesas do oitavo andar.42

A Seção de Correspondência Especial foi inicialmente colocada no sétimo andar. Por ter um acervo menor, em tese teria sido a mais rápida a ser estruturada, mas lidou primeiramente com a difícil junção do arquivo do gabinete de Brasília, que funcionou de 1960 até março de 1970 no prédio do Ministério da Saúde, com os maços chegados do Rio de Janeiro. Nessa atividade, foram incinerados vários documentos, não sendo possível identificar a razão. No ano seguinte, a seção mudou-se para o sexto andar.43

Já a Seção de Originais atuava em Brasília desde meados do ano anterior à mudança. Foi decidido transferir um acervo de dez anos, utilizando o ano-base de 1960. Em julho de 1969, 50% dos volumes já estavam preparados. Aproveitou-se a mudança para uniformizar a organização do acervo, que logo enfrentou a necessidade de separação da documentação em dois arquivos distintos – o corrente, aquele com até dois anos, e o permanente, com documentos mais antigos.44 Essa seria uma das bases da criação do Arquivo Histórico de Brasília. Nos anos seguintes, seriam recebidos da unidade do Rio de Janeiro centenas de volumes deixados para trás no primeiro momento da mudança.45

Se a carência de espaço foi um dos principais problemas no Rio de Janeiro, em Brasília a abundância inicial acabou aprofundando uma questão de grande gravidade: a expansão desordenada dos arquivos correntes de divisões e departamentos. Deve-se considerar, portanto, que, além da Divisão do Arquivo, cada unidade da Secretaria de Estado tinha seus respectivos acervos, e o processo de mudança ensejou desafios particulares. Isso atestou o fracasso da tentativa reformista da década de 1930 de centralização e sinalizou problemas que grassariam por décadas na Divisão do Arquivo em Brasília: a completa desorganização dos acervos correntes sob a guarda das unidades da instituição e as dificuldades no recolhimento e na organização dos arquivos setoriais no arquivo permanente.46

Além da migração do acervo, deve-se estudar a constituição do corpo de servidores. Para eles, a mudança demandou cotidiano novo em horários de expediente mais longos. Isso decorreu de uma realidade que se impôs na nova cidade. Se, no Rio de Janeiro, era crônica a carência de servidores do arquivo, em Brasília a situação inviabilizava o serviço, algo com profundas consequências para o futuro.47

A primeira razão está no fato de somente 30% dos servidores que atuavam na área assumirem suas funções na nova capital – o setor manteve os demais no Rio de Janeiro, onde ainda permaneceria parte do acervo intermediário e o Arquivo Histórico.48 Para se ter ideia, a Seção de Antecedentes, no Rio de Janeiro, funcionava com 21 funcionários; na nova capital, na chegada, havia somente 11. A Seção de Classificação tinha dez servidores; em Brasília, logo no início, não contava com três. Com o trabalho gigantesco de instalação e organização, inexistente no Rio de Janeiro, que se suplementava ao trabalho cotidiano, a situação era desesperadora. O diplomata responsável pela área passou, então, a “pegar no laço” estudantes universitários da cidade.49 No ano seguinte à inauguração das novas dependências, por exemplo, foram contratados oito estudantes de biblioteconomia da Universidade de Brasília, que passaram por um rápido curso de dois meses para iniciarem as atividades.50

Não se pode dizer que houve surpresa. Mesmo antes da mudança, no início de 1970, já se vislumbrava a insuficiência dessa estratégia. Foi nesse contexto que a encarregada do Setor de Arquivo solicitou ao presidente da Comissão de Transferência para Brasília que fosse estudada a possibilidade de transferir servidores contratados do Setor de Portaria (que tinham a quarta série ginasial) para a área.51 Nos meses subsequentes, seriam repetitivas as transferências de serventes, datilógrafos e contínuos. Tais medidas seriam a forma mais comum de manter o setor funcionando nas décadas seguintes, diante da dificuldade de contratar mão de obra capacitada ou de manter os servidores qualificados. Pode-se afirmar que tal orientação partia da premissa de que havia indivíduos promissores atuando em posições subalternas, e de que o próprio setor poderia treiná-los minimamente até que se realizassem concursos para o preenchimento de vagas – duas premissas profundamente equivocadas.52

O problema era agravado pelo ambiente hostil à permanência de colaboradores. Em junho de 1971, a Divisão do Arquivo já estava com seis desfalques de contratados que abandonaram o serviço ou foram transferidos para outras áreas.53 Parte do problema decorria da dinâmica do trabalho, mais rígida do que a existente no Rio de Janeiro, com várias regras formais no local de trabalho. Havia uma série de memorandos operativos (37 somente em 1970) organizando o trâmite de informações no órgão de forma muito severa. Com a chegada de um documento na Seção de Antecedentes, seus servidores tinham no máximo 24 horas para arquivá-lo; qualquer atraso era considerado falta grave. O funcionário deveria sentar-se sem se recostar na cadeira ou utilizá-la como uma espreguiçadeira; não podia dialogar com colegas que estivessem arquivando; não deveria fechar gavetas inferiores com o pé ou joelho; era terminantemente proibido cantar ou assobiar, assim como ler jornais e revistas.54 As condições de segurança, apesar de o prédio ser novo, também eram insuficientes. Em um sábado de julho de 1971, um curto-circuito de uma enceradeira gerou um incêndio que se estendeu para latas de solvente no corredor do sétimo andar, onde estava parte do arquivo. Os dois extintores nos andares não funcionaram e tampouco as mangueiras de água. Foi só com o esforço de utilizar a areia das caixas de cigarros “coletadas às pressas nos andares” que se salvou o acervo – e o prédio – de grande desastre.55

Outro potencial desastre que logo ficaria claro decorreu da concepção espacial no prédio do anexo I. A decisão de transferir as unidades do arquivo para os andares mais altos logo ocasionariam problemas estruturais. Aparentemente, o prédio não fora calculado para receber o acervo em seus andares mais altos e, então, pouco tempo após ter sua primeira organização, houve um remanejamento nos sétimo e oitavo andares. Cem mil maços e 22 mil volumes foram para o subsolo, onde se localizava originalmente parte da garagem, mas onde agora ficaria a Seção de Arquivo Consolidado, embrião da unidade do Arquivo Histórico em Brasília. Isso acabou tendo três consequências. A primeira foi negativa: a mudança levou parte do acervo para local extremamente insalubre e desorganizou ainda mais o arranjo que estruturava o material oriundo do Rio de Janeiro.56 A segunda foi positiva: iniciou-se uma incipiente reflexão sobre a criação de uma unidade de acervo permanente. Por fim, refletiu-se sobre o crescimento do acervo, o que ensejaria a introdução de um progressivo programa de microfilmagem e de eliminação de documentos nas duas décadas seguintes.

Além da dimensão de pessoal, de segurança e de salubridade, outro desafio se adicionava ao cotidiano do arquivo nas novas instalações: o uso exponencial de máquinas de fotocópias. Diante desses elementos, a mudança para Brasília logo criou oportunidade para pensar mecanismos de modernização, sobretudo para reduzir a complexidade do fluxo de informação interno. Em maio de 1970, dois diplomatas da área foram ao Rio de Janeiro entrevistar especialistas no campo da biblioteconomia, da documentação e da arquivologia.57 O objetivo era sobretudo automatizar e mecanizar. A mudança mais importante ensejada por essa reflexão foi o processo de revisão do índice de classificação decimal pelo qual todo documento que entrava, saía ou era produzido internamente era submetido.58 Ele datava de 30 de setembro de 1934 e tinha centenas de páginas. Na década de 1950, uma comissão, em 93 sessões, tentou fazer uma revisão profunda, mas eventualmente fracassada.59 Foi só em 1985 que o sistema foi completamente migrado para o Thesaurus, que perdura com modificações até hoje (Penna Filho, 1999, p. 120).

Para lidar com a tendência insustentável de crescimento do acervo, pela primeira vez as chefias das três seções mais importantes (Correspondência Especial, Originais e Antecedentes) reuniram-se em comissão para começar a conceber o que hoje se denomina de tabela de temporalidade. Fez-se uma sugestão conservadora, pela qual 25% do acervo, abrangendo correspondência do público, notadamente de particulares, seriam eliminados quase imediatamente; os 15% da correspondência que não tratava de política ou assunto de natureza importante, mas com referências que deviam ser guardadas por período limitado, seriam eliminados após dois anos; por fim, 60% seriam de guarda permanente. Associado a esse trabalho foi realizado um primeiro estudo sobre a substância da documentação utilizando-se o acervo da Seção de Antecedentes – 48,5% dos documentos teriam caráter administrativo, 24,5% tratariam de temas substantivos de política externa e os demais de outras temáticas, como consular ou de cerimonial.60 Toda essa análise não conseguiu impactar, contudo, a gestão cotidiana da documentação.

O velho e o novo

A mudança para a nova capital não significou corte definitivo com o acervo deixado no que se denominou Delegação do Itamaraty no Estado da Guanabara (decreto n. 66.260, de 25 de fevereiro de 1970) e, futuramente, Escritório de Representação do Itamaraty no Rio de Janeiro. Nas décadas seguintes, haveria grande interdependência e migração de documentação entre as duas cidades.

Os relatos dos que ficaram na antiga capital são desoladores. Um servidor da Seção de Originais alguns meses depois da mudança, por exemplo, notou: “É possível também que no tumulto da transferência muitos documentos tenham sido esquecidos em algum canto e confundidos com papéis velhos que tenham sido incinerados”. Ele participou do processo de envio de cinquenta caixotes de material anterior à data de corte para Brasília. A ocasião foi a primeira vez em que ocorreu a desinteligência entre unidades das duas cidades – cada uma indicando que uma determinada documentação estava na outra. Foi em decorrência desse problema que se tentou iniciar um inventário conjunto, no Rio de Janeiro e em Brasília, para buscar identificar o que havia permanecido no Rio de Janeiro, o que estava em Brasília e o que foi perdido, algo nunca concluído.61

Nesse aspecto, uma pergunta crucial que hoje se fazem pesquisadores e até os servidores no Rio de Janeiro e em Brasília é como foi dividido o acervo com a transferência para a nova capital. Um memorando de agosto de 1970, de Flávio Miragaia Perri, chefe substituto da Divisão de Arquivo, demonstra que essa questão existia até para os envolvidos no processo de mudança. Ele indicou que o ponto de corte dependia da seção. A Seção de Correspondência Especial transferiu todo o seu acervo, com documentos datando desde a década de 1920. Na Seção de Originais, começava em 1960, mas havia muitas lacunas; já os maços pessoais, de forma inversa, estavam quase todos em Brasília, com algumas exceções – ou seja, alguns datando de servidores que acederam ao órgão antes da Proclamação da República (1889). Ele ainda apontou que, diante da falta de critérios, era elevado o volume de “pedidos de maços de um lado e de outro”. Diariamente, em média, de cinco a dez maços anteriores aos anos-base (1960 e 1965) foram transferidos para a nova capital.62

A partir de 1971, além das solicitações pontuais, ocorreram transferências mais volumosas. Com a extinção da Delegação na Guanabara, por exemplo, executou-se a transferência de cem mil maços para Brasília. Essa parece ser uma das decisões administrativas que cingiu o acervo do período posterior a 1930 de forma irregular.63 Havia, também, movimento inverso, ainda que em menor fluxo. Diante da ausência de um Arquivo Histórico em Brasília, no início da década de 1970, os volumes remetidos por mala diplomática dos postos considerados de valor histórico eram encaminhados ao Rio de Janeiro, como foi a documentação relacionada ao caso “Reclamações do Alabama”, encontrada em depósito da Embaixada do Brasil em Paris.64 O resultado foi o agravamento do quadro de confusão sobre o que está em Brasília e no Rio de Janeiro, em especial a documentação que vai da década de 1930 até a década de 1950 – um levantamento preliminar só na Seção de Antecedentes, em Brasília, interrompido em 2020, identificou mais de cinquenta mil maços de antes da suposta data de corte de 1960.65

Outra dimensão que coincidiu com o processo de planejamento da mudança para Brasília foi o ajuste no sistema de regras formais e práticas cotidianas que regia o acesso ao acervo por pesquisadores externos. Até 1968, sob o decreto n. 56.820, de 1 de setembro de 1965, os interessados enfrentavam uma maratona burocrática, apresentando prova de idoneidade moral, atestado de boa conduta, prova de matrícula universitária, indicação de obras porventura publicadas e carta, com firma reconhecida, explicando os objetivos da pesquisa. A CETHB era crítica desse sistema e, em 1968, em decorrência das demandas dos pesquisadores canalizadas por ela, criou-se uma janela de oportunidade para revisão do decreto de 1965 – tanto o projeto como a exposição de motivos foram discutidos e aprovados pela comissão em negociação que abrangeu historiadores e diplomatas.

A comissão buscou criar três categorias. A primeira, de antes de 1900, ficaria quase toda liberada e sem necessidade de autorização. A segunda, do período de 1900 a 1940, poderia ser consultada após a liberação da avaliação do pleito. Por fim, estaria vedada a documentação referente ao período posterior a 1940. Apesar da proibição, documentos desse último período poderiam ser acessíveis por intermédio de autorização do ministério e parecer da CETHB. As sugestões foram aprovadas e publicadas no decreto n. 64.122, de 19 de fevereiro de 1969.

Ainda que longe do ideal, o novo marco normativo alcançou um inédito patamar de acesso ao acervo, especialmente da documentação da década de 1930. As expectativas logo fracassariam. O clima político mudara sensivelmente. O golpe militar de 1964 fortaleceu progressivamente setores da burocracia vinculados à área de segurança nacional. Por sua vez, o ato institucional n. 5, de 13 de dezembro de 1968, e a onda de demissões de diplomatas no Itamaraty, em 1969, sinalizaram forte autoritarismo (Almeida, 2008). Mesmo assim, o acesso ao acervo histórico ainda funcionava sob o sistema de regras apoiado pelo CETHB.

A ruptura veio com a mudança do acervo para Brasília. O primeiro desafio, como observado, decorreu com a divisão do acervo, com parte substancial de material das décadas de 1930 e 1940 de caráter classificado encaminhada para a nova cidade. Isso prejudicou e ainda prejudica estudos do período relacionado ao Estado Novo (1930-1945) e à atuação brasileira nas negociações do pós-guerra. O segundo desafio veio com a mudança das autoridades diplomáticas para Brasília. Não havia mais os elos de cumplicidade e a pressão cotidiana de pesquisadores, especialmente daqueles vinculados ao CETHB, existentes mesmo após o golpe, em 1964, e a decretação do AI-5, em 1968.

Esse sentimento vinha do topo. Agora confortavelmente instalado em Brasília, o secretário-geral Jorge de Carvalho e Silva, em memorando secreto de maio de 1970, um mês após a instalação do órgão na nova capital, externou sua preocupação sobre a divulgação de documentos a pesquisadores e indicou a necessidade de restringir a consulta a somente “historiadores responsáveis”. Ele também orientou a transferência da documentação sigilosa para cofres e proibiu a retirada de documentos do arquivo, mesmo que para outras áreas do órgão.66

Outras pesadas restrições foram introduzidas. Em 17 de novembro, o ministro Mario Gibson Barbosa encaminhou para o presidente Emílio Garrastazu Médici proposta para revogar o decreto n. 64.122. Para Gibson Barbosa, ele teria sido “excessivamente liberal”.67 No mesmo dia, de forma inédita, foi inserido um artigo secreto no Manual de Serviço do órgão, limitando o acesso à documentação sobre o tema de fronteiras. A partir de então, a liberação para consulta dependia de opaco e minucioso sistema de consultas internas por três níveis hierárquicos e com expressa autorização do ministro de Estado.68

A reação dos historiadores da CETHB à nova regulamentação foi rápida. Havia, antes de tudo, muita surpresa. Não fazia nem dois anos que a regulamentação anterior entrara em vigor. Além disso, as novas regras foram redigidas sem qualquer comunicação aos membros da comissão, em franca contradição a mais de duas décadas de atuação da instância. O resultado, para eles, era nefasto. O Brasil passaria “a figurar em último lugar entre as nações cultas no que toca ao acesso às fontes históricas existentes no Itamaraty”. Além disso, o regramento ia na contramão de outros países ‒ que já baixavam as regras de sigilo para quarenta e trinta anos, enquanto a nova diretriz do órgão se estenderia por 120 anos. Os membros sentiam-se especialmente atingidos pela acusação de que a legislação de 1969 era “excessivamente liberal” e clamaram por uma reunião com Gibson Barboza. Nesse ponto, convém notar que a comissão fora recebida por todos os ministros efetivos anteriores, a começar por Oswaldo Aranha, e que os normativos de 1965 e 1969 foram redigidos em reuniões com os ministros Vasco Leitão da Cunha, Juracy Magalhães e José de Magalhães Pinto.69 A atitude de Gibson Barboza foi uma ruptura com o passado. A comissão sobreviveria do ponto de vista formal, mas mergulharia na irrelevância.

A mudança para Brasília simbolizou, portanto, retrocesso. As consequências das mudanças de 1970 para a agenda dos pesquisadores foram diretas. Os números gerais também são termômetro preciso desse fechamento. Em 1970, o Arquivo Histórico no Rio de Janeiro recebeu 44 pesquisadores nacionais e 28 estrangeiros; no ano seguinte, foram somente 23 nacionais e 13 estrangeiros.70 Mesmo após a democratização, na década de 1980, ainda perduraria uma preocupação sobre aspectos “sensíveis da história diplomática brasileira” e sobre a nacionalidade dos requerentes, como aponta despacho em 1986.71

Um efeito colateral da restrição do acesso externo ao acervo histórico e do ambiente singular de Brasília foi o aumento do nível de sigilo da documentação do Itamaraty, com rápida inflação de expedientes na classificação confidencial. Documentos sobre assuntos que até então trafegavam como ostensivos foram aos poucos migrando para as demais categorias. A circular postal de 8 de dezembro de 1970 apontou o “abuso na classificação”, algo que retardava “desnecessariamente a tramitação de documentos” e depreciava “a importância do grau de sigilo”.72 Foi uma batalha rapidamente perdida. Os servidores não só cada vez mais usavam a classificação confidencial e secreta para assuntos rotineiros como o número de expedientes elevou-se consideravelmente.73 Na ausência do anexo II, essa explosão de documentos foi acrescida de milhares de fotocópias que circulavam pelas unidades da instituição. Foi nesse contexto que o Setor de Microfilmagem foi transferido do Rio de Janeiro para Brasília.74

Se no Rio de Janeiro a microfilmagem foi utilizada primordialmente no Arquivo Histórico, em Brasília a área ficou vinculada ao Departamento de Comunicações e Arquivo. Sem que a CETHB fosse ouvida ou que a experiência pregressa do Rio de Janeiro tivesse sido apreciada, iniciou-se a rotinização da microfilmagem das principais séries documentais, em particular os despachos telegráficos e telegramas, começando de forma geral no final da década de 1960 e seguindo para os anos recentes. Esse esforço perdurou por quase duas décadas, sendo produzidos quase três mil rolos de 16 e 32 milímetros e suas respectivas cópias de segurança. Houve excessivo otimismo sobre o ritmo do processo (cogitou-se microfilmar até os cinquenta milhões de documentos do Arquivo Consolidado) e suas funções (com a hipótese de disseminação de livros, jornais e revistas e distribuição de cópias de rolos para postos no exterior).75 Mais importante: houve eliminação da documentação original após a microfilmagem.

O que não foi apreciado no processamento da atividade foram os problemas rotineiros na conferência antes da eliminação, além de documentos propositalmente retirados do processo de microfilmagem. Desse modo, há muitas páginas faltantes ou ilegíveis nos microfilmes, impossíveis de serem recuperadas em decorrência da eliminação dos originais.76 Outra situação grave, que ficaria mais nítida nas décadas seguintes, foi o cuidado com o acervo. Na década de 1960, servidores do Rio de Janeiro já sabiam que a ausência de climatização adequada levava à destruição de microfilmes, no que é comumente denominado de síndrome do vinagre.77 Em Brasília, em decorrência do clima mais seco, das instalações climatizadas mais sofisticadas e da maior estabilidade da energia elétrica, esse problema demorou para se manifestar. Nos anos 2000, porém, foi detectado que não só os originais, mas muitas cópias de segurança foram afetadas, em parte em decorrência da mudança do acervo de microfilmes para o subsolo do anexo II.78

A aceleração do processo de microfilmagem e de eliminação de documentação fez parte do contexto do fim do debate sobre o uso do Arquivo Histórico no Rio de Janeiro como única unidade responsável pela guarda do acervo permanente. Isso, no entanto, não ensejou automaticamente a definição de que haveria, na nova capital, outro Arquivo Histórico. Segundo o regimento de 1977, a Seção de Arquivo Consolidado da Divisão de Arquivo, em Brasília, teria de transferir para o Arquivo Histórico da Divisão de Documentação Diplomática, que funcionava no Rio de Janeiro, toda a correspondência com mais de 15 anos.79

Isso envolveria um grande volume já transportado para Brasília. Com quase trinta anos na nova capital, o acervo teria 2.650 metros lineares – distribuído em 140 mil códices e mais de um milhão e meio de páginas (Lázaro, 2000, p. 103).

A discussão sobre o arquivo em Brasília e uma abertura mais sistemática do acervo do Rio de Janeiro evoluiu na década de 1980 no contexto da democratização do país. Tentou-se, em particular, ressuscitar o modelo da CETHB, criando em 1987 a Comissão de Estudos de História Diplomática (CEHD) e, no ano seguinte, a Comissão Permanente de Revisão do Arquivo Histórico (CPRAH).80 Assim como a antecessora, essas instâncias teriam a competência de propor normativo sobre como pesquisadores externos poderiam acessar o acervo e ajudar no esforço de desclassificação. Nenhuma das duas, contudo, serviu para melhorar o acesso, como foi o caso da CETHB.81

Essa dificuldade foi uma herança do período autoritário. Ao contrário da época em que o Itamaraty funcionava no Rio de Janeiro, criou-se após 1970 uma cultura bem menos permissiva aos usuários externos. Esse fato pode ser observado pela legislação aprovada no primeiro governo civil, na segunda metade da década de 1980. Foi proibido o acesso a documentos com “informações suscetíveis de pôr em risco a segurança do país e as relações do Brasil com terceiros países e organismos internacionais”, além daqueles que pudessem “afetar a vida privada das pessoas”. Isso significa que, mesmo com o transcurso de tempo previsto na legislação, os servidores poderiam bloquear o acesso por interpretações subjetivas sobre a sensibilidade do material, o que fez com que o novo normativo fosse pior do que aqueles em vigor na ditadura.82 A implementação, envolvendo a apreciação por autoridades diplomáticas em Brasília sobre o acesso a categorias de documentos do Arquivo Histórico no Rio de Janeiro, piorou o acesso.83 A comunidade acadêmica reprovou a nova situação, por se chocar com o movimento de abertura democrática pelo qual passava o país (Lázaro, 2000, p. 100). Com a Lei de Acesso à Informação, de 2011, criou-se um ambiente liberalizante em termos de acesso à documentação custodiada por órgãos públicos, ao qual o Itamaraty teve de se adaptar para atendimento de pesquisadores externos e internos.

Não é justo, todavia, creditar às crenças corporativas toda a responsabilidade pelas dificuldades enfrentadas pelos pesquisadores. A falta de acessibilidade às unidades do arquivo em Brasília também decorreu de três outros fatores. O primeiro foi a reestruturação no quadro de servidores. Por muito tempo, o Itamaraty promoveu concursos para carreiras especializadas – redator, documentarista, bibliotecário, taquígrafo, escriturário, arquivista, arquivologista, datilógrafo, criptólogo, impressor e outros cargos. As lideranças das seções do arquivo em Brasília foram por mais de uma década oriundas dessas carreiras, principalmente as de arquivista e arquivologista.84 Na década de 1980, porém, houve fratura desse sistema. Não mais foram realizados concursos especializados, e o quadro de servidores lentamente degradou-se. No início do século XXI, não mais havia arquivistas do quadro do Itamaraty em Brasília.85 Assim, quando o acervo permanente do órgão abriu suas portas aos pesquisadores, inexistia força de trabalho competente para dirigir sua organização.

Outro fator importante foi a finalização da construção do anexo II (apelidado de “Bolo de Noiva”), no final da década de 1980. No período, o Itamaraty passou a contar com cada vez menos arquivistas, que não eram prestigiados na instituição. Além disso, a conclusão das instalações do Bolo de Noiva acabou gerando desafios, compreendendo tanto o processamento de documentos quanto o acesso do público.86 A mudança para as novas instalações, por sua vez, foi caótica. Foram contratados diaristas para migrar as caixas, em processo desordenado e carente de supervisão. O resultado foram milhares de caixas jogadas nos novos depósitos, em especial na Seção de Antecedentes, desfazendo os arranjos concebidos na chegada do órgão a Brasília na década de 1970 e inutilizando os poucos e imprecisos fichários e inventários existentes.87 Somente nos anos 2000, com a aquisição de modernas estantes deslizantes, as caixas foram colocadas em seu local permanente. As dificuldades da primeira geração de pesquisadores, desse modo, não decorreram somente do marco normativo restritivo, e a impossibilidade de achar maços e documentos perdura até os dias de hoje.

O terceiro fator no contexto das dificuldades dos pesquisadores decorreu da estrutura administrativa de apoio. Em pouco mais de trinta anos, a área de arquivo do ministério foi sujeita a diferentes modificações do organograma do órgão. Inicialmente denominada Divisão de Documentação Diplomática, passou em seguida a se chamar Coordenação-Geral de Documentação Diplomática, sendo, por fim, eliminada da estrutura do Itamaraty. O ciclo de desprestígio, iniciado com a mudança para Brasília, alcançara, então, a sua plenitude.

Conclusão

Em 2000, ao perscrutar o acervo do Itamaraty em Brasília, uma diplomata chegou à conclusão de que o arquivo tinha “documentação valiosa desordenadamente arquivada, critérios metodológicos defasados [e] cultura de preservação documental esquecida” (Lázaro, 2000, p. 138). O objetivo deste artigo foi compreender a origem dessas três características.

Com esse intuito, foi apresentada sua origem, no Rio de Janeiro, e sua modernização da década de 1930 a década de 1960. O primeiro aspecto salientado é o fato de nunca ter existido um único “Arquivo do Itamaraty”. A despeito dos repetidos esforços de centralização, tanto no Rio de Janeiro como em Brasília, os acervos estavam pulverizados em diversas unidades administrativas. Mesmo os de caráter permanente acabariam divididos entre as duas cidades. No artigo, demonstrou-se como equivocada a tese de que o ano de 1960 possa ser considerado como o corte dos fundos existentes, apresentando as razões que explicam a existência de documentação de várias séries anteriores a este ano em Brasília.

A natureza desordenada do acervo, característica dos dias de hoje, decorreu primeiramente dos processos de mudanças. Além da migração para Brasília, unidades do arquivo sofreram três transferências adicionais. Primeiro, dos andares superiores do anexo I para o subsolo; depois, para os depósitos do anexo II; e, por fim, das estantes fixas para as deslizantes. Em cada elo desse processo, a atividade de descrição arquivística foi interrompida e reiniciada. Hoje, cinco décadas após a mudança, somente a Seção de Correspondência Especial conta com descrição de algumas de suas séries documentais. É necessário, contudo, adaptar as planilhas de dados às premissas do Conselho Nacional de Arquivos (Conarq) e seguir a Norma Brasileira de Descrição Arquivística (Nobrade), a fim de se constituir, efetivamente, um inventário arquivístico.

Essa defasagem metodológica também está associada ao processo de mudança. Ainda que no Rio de Janeiro as unidades custodiadoras do acervo sofressem com falta de pessoal, a situação de Brasília tornou-se crônica. Parte importante dos servidores do setor não se deslocou para a nova capital e o recrutamento de novos colaboradores acabou trazendo indivíduos que, além de desqualificados para as funções, foram poucos para os inúmeros desafios que enfrentaram. A mentalidade sobre o acesso aos acervos também não ajudou. A chegada a Brasília coincidiu com o acirramento do autoritarismo da ditadura militar, algo que ensejou a elevação de restrições a pesquisadores externos. Esse arcabouço de regras perdurou com a democratização.

Quando se ratificou, na década de 1980, a impossibilidade de manter o acervo permanente somente no Rio de Janeiro, tomando-se a decisão de criar unidade paralela em Brasília, não só inexistia espírito convergente para a abertura como a instituição carecia de força de trabalho adequada para atividades básicas que compreendem o ciclo vital da documentação, como registro, descrição, armazenamento, indexação, transferência dos acervos intermediários para o permanente e busca. Atualmente, há esforço para melhorias, capitaneado especialmente por servidores de uma geração mais propensa a digitalizar processos e rotinas. Nesse sentido, pode-se eventualmente vislumbrar a superação da imagem de uma “documentação valiosa desordenadamente arquivada”, conforme descrição da embaixadora Maria-Thereza Lázaro.

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Recebido em 15/2/2023

Aprovado em 18/5/2023


Notas

1 De Leite Ribeiro para chefe do gabinete do ministro de Estado, 5 de março de 1970. Maço Temático (MT) Secreto. Caixa 136. Seção de Correspondência Especial (SCE). Unidade de Brasília do Arquivo Histórico do Itamaraty (AHI-BSB).

2 Esses e outros conceitos serão utilizados tomando-se como referência Arquivo Nacional (2005).

3 De Pinheiro Ferreira para Camillo Martins Lage. Rio de Janeiro, 16 de abril de 1821. 37ª,01,005,N022. Biblioteca Nacional; De Pinheiro Ferreira para Baptista Filgueiras. Palácio de Queluz, 4 de setembro de 1821. Diário das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, n. 170. Lisboa, 6 de setembro de 1821; Diário das Cortes Gerais e Extraordinárias da Nação Portuguesa, n. 183. Lisboa, 24 de setembro de 1821.

4 A correspondência permaneceu no Brasil e hoje está disponível no Arquivo Histórico do Itamaraty no Rio de Janeiro (AHI-RJ) nos maços 355.2.201.2.1 e 355.2.201.2.2.

5 Todos os relatos de mudanças administrativas estão registrados em Castro (2009a; 2009b).

6 A medida foi determinada pela circular n. 292, de 14 de fevereiro de 1929. De acordo com um relatório, em 1929, com exceção das embaixadas na Santa Sé e no México, todas as missões diplomáticas já haviam encaminhado seus acervos históricos. Mas como ficaria claro nas décadas seguintes, a orientação não foi seguida de forma plena – mesmo em 2019 o Itamaraty em Brasília recebia documentos referentes à Revolução Russa enviados de Moscou. Waldemar de Araújo para DCA, 5 de julho de 1939. MT 47.596. Seção de Antecedentes (SAN). AHI-BSB.

7 Gregório Pecegueiro do Amaral, desde 1911; Napoleão Reis, desde 1913; Sílvio Romero Filho, desde 1916; Henrique José de Saules e Manuel Coelho Rodrigues, desde 1918. Ver Anuários de Pessoal do Ministério das Relações Exteriores.

8 Correspondência sem data disponível. MT 41.819. SAN. AHI-BSB.

9 Célia Neves para diretor-geral do Tesouro. Belo Horizonte, julho de 1933. MT 41.731. SAN. AHI-BSB.

10 Murillo Basto para chefia do arquivo, 23 de dezembro de 1931. MT 47.596. SAN. AHI-BSB.

11 Oliveira Neto para Departamento Administrativo, 27 de outubro de 1941. MT 41.715. SAN. AHI-BSB.

12 Célia Neves para diretor-geral do Tesouro. Belo Horizonte, julho de 1933. MT Caixa 579.

13 Fernandes Pinheiro para SG, 26 de setembro de 1932; Moreira da Silva. Papéis retirados do Arquivo da Correspondência Especial para serem eliminados, 20 de fevereiro de 1938. MT Caixa 579.

14 Relatório. Alfredo Ponzin, 28 de janeiro de 1933. MT 47.654. SAN. AHI-BSB.

15 Pinheiro de Vasconcellos para Oswaldo Aranha, 21 de janeiro de 1938. MT Caixa 570.

16 Sobre a atuação do Dasp no desenvolvimento da arquivologia no Brasil, ver Santos (2018).

17 Como em outras áreas do órgão, o arquivo foi profundamente impactado pela chamada reforma San Tiago Dantas. A lei n. 3.917, de 14 de julho de 1961, que criou a Divisão de Documentação, substituindo o antigo Serviço de Documentação.

18 St. Brisson a Oswaldo Aranha, 11 de fevereiro de 1943. MT 41.715. SAN. AHI-BSB.

19 Souza Gomes para Alves de Souza, 24 de abril de 1944. MT. 47.654. SAN. AHI-BSB.

20 Ferreira Braga para Alves de Souza, 7 de julho de 1944. MT 41.715. SAN. AHI-BSB.

21 Teria outras denominações, como Seção do Arquivo Consolidado.

22 Ruy de Miranda para Departamento de Administração (DA), 19 de janeiro de 1955. Códice Arquivo (55-60). Seção do Arquivo Histórico (SAH). AHI-BSB.

23 Leite Ribeiro a Mafra Peixoto, 29 de março de 1951. MT 47.596. SAN. AHI-BSB.

24 Guimarães Filho para DA, 25 de fevereiro de 1959. Códice Arquivo (55-60). SAN. AHI-BSB.

25 Leite Ribeiro a Mafra Peixoto, 29 de março de 1951. MT 47.596. SAN. AHI-BSB.

26 Ruy de Miranda. Relatório das atividades do serviço de arquivo de abril de 1954 a novembro de 1955. Códice Arquivo (55-60). SAH. AHI-BSB.

27 Do serviço de expedição para Divisão de Comunicações e Arquivo, 17 de julho de 1963. Códice Serviço de Coordenação (57-65). SAH. AHI-BSB.

28 Soares de Pinna. Relatório do Serviço de Originais, 1931. MT Caixa 598. SAN. AHI-BSB.

29 Rainho Neves para Emílio Ribeiro, 24 de maio de 1957. Códice Arquivo (55-60). SAH. AHI-BSB.

30 Wright para SD, 9 de abril de 1959. MT 93.653. SAN. AHI-BSB.

31 DPO ao SG, 10 de fevereiro de 1953. MT 93.653. SAN. AHI-BSB.

32 Souza Gomes para Divisão Cultural, 29 de janeiro de 1953. MT 93.653. SAN. AHI-BSB.

33 Constança Wright para Nelson Alves da Fonseca, 28 de julho de 1966. Memos confidenciais. SCE. AHI-BSB. Ver despachos no mesmo documento.

34 Alcides Guimarães para DA, 22 de junho de 1960. Códice Arquivo (55-60). SAH. AHI-BSB; Renato Almeida para DA, 10 de julho de 1958. Códice Divisão de Documentação (DD) (1958-64). SAH. AHI-BSB.

35 Amaral Murtinho para Castelo Branco, 17 de janeiro de 1966. Códice CTRB. SAH. AHI-BSB; Souza Palhares para DA, 2 de junho de 1967. Códice Divisão de Comunicação e Arquivo (1967). SAH. AHI-BSB.

36 O melhor trabalho já realizado sobre o Palácio dos Arcos está disponível em Granafei (2020).

37 Constança Wright a Serviço de Documentação, 11 de dezembro de 1967. Códice DD (1967-68). SAH. AHI-BSB.

38 Lydia L. para Alves da Fonseca, 30 de setembro de 1965. Códice DD (1965-66). SAH. AHI-BSB.

39 Ayrton Diniz para DA, 17 de julho de 1969. Códice DAR (1967-69). SAH. AHI-BSB.

40 De Leite Ribeiro para chefe do DA Secreto, 17 de março de 1970. MT 352.220; De Leite Ribeiro para chefe do gabinete do ministro de Estado, 5 de março de 1970. MT Secreto. Caixa 136. SCE. AHI-BSB.

41 Soares de Moura para DA, 1 de dezembro de 1969; Boisson Cardoso para CTRB, 8 de dezembro de 1969. MT Confidencial. Caixa 518. SCE. AHI-BSB.

42 Sousa Vargas para Gabinete, 5 de janeiro de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

43 Miragaia Perri para DA, 13 de janeiro de 1971. Códice DAR (1971). SAH. AHI-BSB.

44 Ary Develly para Miragaia Perri, 18 de setembro de 1970. Códice Originais (1970). SAH. AHI-BSB.

45 Ary Develly para DAR, 10 de junho de 1971. Códice Originais (1971). SAH. AHI-BSB.

46 Paiva Oliveira para DAJ, 17 de julho de 1970. MT 117.218. SAN. AHI-BSB.

47 Sousa Vargas para DA, 14 de janeiro de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

48 Miragaia Perri para DA, 13 de janeiro de 1971. Códice DAR (1971); Relação nominal a que se refere a portaria 294. DRE. MT 119.286. SAN. AHI-BSB.

49 Costa Guimarães para DA, 31 de março de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

50 Miragaia Perri para DA, 13 de janeiro de 1971. Códice DAR (1971). SAH. AHI-BSB.

51 Sousa Vargas para CTB, 5 de março de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

52 Sousa Vargas para SGA, 6 de março de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

53 Miragaia Perri para DA, 23 de junho de 1971. Códice DAR (1971). SAH. AHI-BSB.

54 Ary Develly para funcionários lotados na SAN e Originais, 8 de março de 1972 e 19 de maio de 1972. Códice SAN e SOE (1972). SAH. AHI-BSB.

55 Miragaia Perri para DA, 20 de julho de 1971. Códice DAR (1971). SAH. AHI-BSB.

56 Renato Marques para Adolpho Benevides, 5 de fevereiro de 1982. Memos Secretos. SCE. AHI-BSB.

57 Costa Guimarães para DA, 6 de maio de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

58 Miragaia Perri para DA, 23 de outubro 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

59 Ruy de Miranda para DA, sem data. Códice Arquivo (55-60). SAH. AHI-BSB.

60 Critérios do levantamento do Grupo de Trabalho, 23 de março de 1971; Distribuição de assuntos no Arquivo de Antecedentes, 7 de maio de 1971. Códice DAR (1971). SAH. AHI-BSB.

61 Ary Develly para Miragaia Perri, 3 de outubro de 1970. Códice Originais (1970). SAH. AHI-BSB.

62 Maragaia Perri ao DA, 10 de agosto e 10 de setembro de 1970. Códice DAR (1970). SAH. AHI-BSB.

63 Rezende de Castro para DAR, 26 de setembro de 1972; J. R. Barbosa para DA, 26 de julho de 1972. Códice DAR (1972). SAH. AHI-BSB.

64 Ary Develly para J. R. Barbosa, 30 de dezembro de 1972. Códice SAN (1972). SAH. AHI-BSB.

65 Na ocasião, o autor do artigo estava realizando pesquisa no acervo e a informação foi coletada com base nos arquivos preparatórios. Ver painel “Datas iniciais” em: https://public.tableau.com/app/profile/ipri3179/viz/Maostemticos/Maossemnmero. Acesso em: 12 jan. 2023.

66 De Carvalho e Silva para chefe do DA, 13 de maio de 1970. Memos Secretos. SCE. AHI-BSB.

67 De Gibson Barboza para Emílio Médici, 16 de novembro de 1970. Caixa MT Secreta 137. SCE. AHI-BSB.

68 Instrução de Serviço n. 15. Consultas ao Arquivo Histórico. Brasília, 17 de novembro de 1970. Caixa MT Secreta 137. SCE. AHI-BSB.

69 Memo CETHB/4 para Deleguan, 8 de dezembro de 1970. Caixa MT Secreta 137. SCE. AHI-BSB.

70 Listagem com base na documentação disponível nas caixas DD 1970 e 1971. SAH. AHI-BSB.

71 Ver, por exemplo: De Pedro Motta Pinto para DCD, 31 de julho de 1986. Memos confidenciais. SCE. AHI-BSB.

72 Circular postal n. 274, 8 de dezembro de 1970. Adicionalmente, houve a implementação de rotina para documentos secreto-exclusivos e ultrassecretos. A circular n. 1.172 determinou que não se fizessem em nenhuma hipótese cópias dos secreto-exclusivos, algo que teria profundas consequências para a preservação documental dessa série. Os dois documentos estão na caixa sem número de circulares de 1986 da SAH. AHI-BSB

73 A subsérie memoranda confidencial depositada na Seção de Correspondência Especial hoje, por exemplo, tem 28 caixas para toda a década de 1960 e 58 caixas para a década seguinte, padrão repetido em outras subséries classificadas. Miragaia Perri para SCE, 28 de fevereiro de 1972. Códice DAR (1972). SAH. AHI-BSB.

74 J. R. Barbosa para DAR, 19 de julho de 1972. Códice DAR (1972). SAH. AHI-BSB.

75 Dados do inventário de 2014. Relatório microfilmagem (1º subsolo, sala 18 e Reserva Técnica), 3 de abril de 2014. Este documento está disponível de forma física nas dependências da Divisão de Comunicação e Arquivo. As sugestões foram registradas no Relatório de 1975. Ver Ministério das Relações Exteriores (1975, p. 358).

76 Sobre os desafios da organização do trabalho, ver: De Renato Marques para DCD, 1˚ de junho de 1981. Secreto. AHI-BSB.

77 As discussões sobre a natureza tecnológica da microfilmagem da década de 1950 e 1960 no Itamaraty estão no Maço Temático 85.925. Sobre a síndrome do vinagre, ver Reilly (2001).

78 Em agosto de 1988 o setor de microfilmagem foi transferido do anexo I para o recém-construído anexo II, comumente denominado “Bolo de Noiva”. De Marco Cesar Meira Naslausky para SG, 15 de outubro de 1987; De Sérgio Damasceno Vieira para SG, 25 de agosto de 1988. Confidencial. AHI-BSB.

79 Regimento Interno da Secretaria de Estado das Relações Exteriores. Portaria n. 456, de 24 de outubro de 1977.

80 Portarias n. 593 e 594, de 12 de outubro de 1988. Elas foram reproduzidas em Ministério das Relações Exteriores (1988).

81 A CEHD foi criada na revisão do Regimento Interno da Secretaria de Estado, em 1987. Sobre sua permanência, ver, por exemplo, o decreto n. 3.414, de 14 de abril de 2000.

82 Artigo 6º da portaria n. 593, em Ministério das Relações Exteriores (1988, p. 135).

83 Ver Regimento Interno da Secretaria de Estado das Relações Exteriores, publicado pela portaria n. 580, de 13 de maio de 1987.

84 A diferença entre arquivista e arquivologista remonta ao ano de 1977, quando se discutiu a legislação sobre a profissão. Muitos defendiam o entendimento de que arquivologista fosse usado para o profissional de nível superior e arquivista para aquele com formação técnica de segundo grau.

85 Os arquivistas remanescentes estavam cedidos para outros órgãos ou deslocados para diversas funções no ministério. Ocasionalmente profissionais arquivistas de outros órgãos foram cedidos ao Itamaraty. Essas informações foram repassadas ao autor por servidores da área em 2010 e 2017.

86 A comparação aqui é, naturalmente, com as boas práticas já existentes na época e que, futuramente, seriam consolidadas em Conselho Nacional de Arquivos (2000).

87 As informações sobre o processo de mudança foram dadas ao autor pelos técnicos João Rocha de Souza e Jorge Luiz Dias Filhos, ambos já aposentados, que participaram do processo e que estavam na ativa em 2010.



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