Acervo, Rio de Janeiro, v. 36, n. 2, maio/ago. 2023

Marc Ferrez: a fotografia como experiência | Dossiê temático

Desafios de publicação e representação de fotografias estereoscópicas

No rastro dos autocromos de Marc Ferrez

Challenges of publication and representation of stereoscopic photographs: in the trail of Marc Ferrez’s autochromes / Retos de la publicación y representación de fotografías estereoscópicas: tras los autocromos de Marc Ferrez

Camila Mangueira Soares

Doutora em Comunicação e Semiótica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Investigadora integrada do Instituto de Investigação em Arte, Design e Sociedade (i2ADS), Universidade do Porto, Portugal.

camilamangueira19@gmail.com

Simone Wicca

Mestra em Artes Visuais pela Universidade de Campinas (Unicamp). Doutoranda em Poéticas Visuais, no Instituto de Artes da Unicamp, Brasil.

simonewicca@gmail.com

Resumo

A crescente publicação de fotografias estereoscópicas históricas tem chamado a atenção para a emergência de diferentes processos de remediação. O artigo observa fotografias de Marc Ferrez exibidas na exposição e no catálogo Marc Ferrez: Território e Imagem (2019), assim como no acervo on-line do Instituto Moreira Salles. Com isso, procuramos contribuir para uma crítica dos objetos fotográficos históricos por uma perspectiva processual.

Palavras-chave: estereoscopia, fotografia, cultura digital, Marc Ferrez.

Abstract

The growing publication of historical stereoscopic photographs has called attention to the emergence of varying remediation processes. The article analyses photographs by Marc Ferrez displayed in the exhibition Marc Ferrez: Território e Imagem (2019) and published in its catalog, and in the online collection of the Instituto Moreira Salles. We seek to contribute to a critique of historical photographic objects from a procedural perspective.

Keywords: stereoscopy, photography, digital culture, Marc Ferrez.

Resumen

La creciente publicación de fotografías estereoscópicas históricas ha llamado atención para la emergencia de diferentes procesos de remediación. El artículo observa fotografías de Marc Ferrez expuestas en la exposición Marc Ferrez: Território e Imagem (2019) y publicadas en su catálogo, y en la colección en línea del Instituto Moreira Salles. Nosotros buscamos contribuir para una crítica sobre los objetos fotográficos históricos por una perspectiva procedimental.

Palabras clave: estereoscopia, fotografía, cultura digital, Marc Ferrez.

Fotografias estereoscópicas como objetos na cultura digital

Diante do contexto atual de oferta abundante de ferramentas técnicas e tecnologias de processamento e de comunicação on-line, parece ser no mínimo controverso propor uma reflexão sobre desafios de publicação e representação de fotografias estereoscópicas dos séculos XIX e XX. É à medida que nos aprofundamos nos fenômenos de migrações desses objetos para outros meios e linguagens que nos damos conta dos problemas e variantes do seu tratamento e de sua exibição. A diversidade dos seus processos e a complexidade de suas materialidades são ainda um desafio para técnicos, especialistas e pesquisadores da cultura visual.

O artigo parte da percepção da crescente publicação e proliferação de versões digitais de fotografias estereoscópicas de séculos anteriores. Fato que responde em parte à crescente necessidade de digitalização de acervos artísticos e documentais, seguida de novos protocolos e formatos de catalogação, conservação e manutenção desses arquivos. Para isso, analisamos fenômenos de aparições de versões digitais, informações e formatos dos pares de autocromos estereoscópicos do fotógrafo brasileiro Marc Ferrez, autor cujo acervo iconográfico tem sido estudado por historiadores e pesquisadores1 da imagem e difundido pelo Instituto Moreira Salles (IMS) através de parcerias com outras instituições internacionais, como o Google Arts and Culture, e da criação de projetos novos, com uso de tecnologias digitais on-line, como o Imagine Rio.2

De maneira geral, a abordagem adotada assume um viés materialista e processual (Batchen, 1997, 2021; Huhtamo; Parikka, 2011; Kuc, Kamila; Zylinska, 2016; Salles, 2006), isto é, leva em consideração a participação dos suportes e dos meios em que os objetos imagéticos são produzidos, difundidos e assumem novos significados ao longo do tempo. Nessa perspectiva, a estratégia analítica contempla relações entre os autocromos estereoscópicos e suas versões contemporâneas trabalhadas na exposição Marc Ferrez: Território e Imagem (2019) e publicadas no catálogo homônimo, no site oficial e no acervo on-line do IMS. Esse exame também considerou versões de autocromos estereoscópicos de Ferrez que aparecem dispersas em matérias jornalísticas no site oficial do instituto e de seus parceiros, uma vez que fornecem formatos variados de imagens.

No rastro dos autocromos estereoscópicos

Foi ao lado de formas como o carte-de-visite e o cartão-postal que a fotografia estereoscópica se consagrou como um dos tipos significativos de produção visual (Adams, 1999), trazendo a participação do observador ao processo de formação da imagem (Crary, 1992). Seu consumo e disseminação popular tiveram seu auge na Europa durante a Era Vitoriana. As razões de seu declínio comercial e desaparecimento ainda são fruto de discussão entre estudiosos3 e especialistas da área. Contudo, é possível contemplar, através de momentos de transições tecnológicas e materiais, algumas das retomadas e dos declínios da produção da fotografia estereoscópica, como a inserção das chapas de autocromos.

Anunciado comercialmente pelos irmãos Auguste e Louis Lumière, na França, em 1903, o autocromo surge como o primeiro processo fotográfico em cor comercialmente viável (Lavédrine; Gandolfo, 2009). A novidade é absorvida principalmente pelo fotógrafo amador e caracteriza uma vasta criação de fotografias estereoscópicas sobre assuntos cotidianos e pessoais. Uma das peculiaridades dessas imagens corresponde também à sua visualização: quando observadas em contraluz ou projetadas, elas filtram as cores, formando uma imagem colorida positiva direta. Os estereoscópios comumente utilizados para visualização de pares de autocromos na Europa eram chamados de Verascope4 e Taxiphote.5 As placas de autocromo foram produzidas até 1935, quando o processo de cor cromogênico as substituiu (Lavédrine; Gandolfo, 2009).

A preocupação com a conservação e a reprodução de objetos de séculos anteriores ‒ que envolve a criação de cópias, réplicas, migrações de materiais, de informações, produção de conhecimento, entre outros ‒ não se trata de algo recente, mas foi potencializada com a inserção das tecnologias digitais. Isso nos leva a questionar como os processos de reprodução fotográficos digitais expandiram e/ou modificaram as maneiras como percebemos, encontramos e entendemos as fotos estereoscópicas de séculos anteriores. É com a predominância de uma cultura voltada para os meios computacionais on-line e os processos de digitalização que objetos fotográficos passam a responder às dinâmicas de ferramentas e sistemas de comunicação em constante atualização. Situação de convergência e hibridez entre meios e linguagens que caracteriza o que Bolter e Grusin (2000, p. 19) chamam de remediação, isto é, os “modos particulares em que as novas mídias reconfiguram as mídias tradicionais e os modos em que as mídias tradicionais reconfiguram-se a si mesmas para fazer frente aos desafios das novas mídias”. Diante dessa percepção, assumimos a ideia de remediação como uma via de exame de alguns dos percursos das fotografias estereoscópicas, com atenção, sobretudo, para suas passagens entre diferentes meios, cenários e materiais. Observando, assim, como esses objetos admitem novas estéticas, funcionalidades e enquadramentos com efeitos na interpretação de suas materialidades e seus contextos de origem.

Sem perder de vista essas questões, faz-se fundamental discorrer um pouco mais sobre o contexto da fotografia estereoscópica, mas dessa vez pela perspectiva de um de seus produtores, o brasileiro Marc Ferrez.

Marc Ferrez e a fotografia estereoscópica

Apesar de Marc Ferrez6 ser mais conhecido nacional e internacionalmente por seus registros de monumentais vistas do Rio de Janeiro, foi um dos fotógrafos de sua época que mais viajou pelo território do Brasil realizando trabalhos fotográficos comissionados para o levantamento de regiões do país. Em 1875, integrou a Comissão Geológica do Império, onde, além de registrar negativos de vidro de 24x30 cm, também fez uso da estereoscopia para registrar volumes e relevos das regiões visitadas. De acordo com Sergio Burgi,7 no álbum da comissão existiam quarenta fotografias feitas com câmera estereoscópica, como a da cachoeira de Paulo Afonso, na qual está “dando uma percepção volumétrica do espaço, da geografia, usando um recurso tecnológico. Ou seja, não está encarando isso como uma brincadeira em 3D, está pensando a imagem a serviço do conhecimento, na construção do conhecimento”.

Em 1880, Ferrez trabalhou também numa extensa documentação fotográfica das construções e modernização de ferrovias, participando da difusão de uma imagem de prosperidade do país. É por meio do registro desses grandes empreendimentos de engenharia que Ferrez consolida sua carreira como fotógrafo especialista nos procedimentos e técnicas fotográficas. Nos anos 1890, Ferrez se tornou um “próspero comerciante, representante dos principais fabricantes mundiais de equipamentos fotográficos e introdutor, no Brasil, das últimas novidades da área” (Ceron, 2019, p. 64). Ser representante e fornecedor de materiais e equipamentos fez com que estivesse sempre atualizado e interessado nas inovações técnicas da área.

O trabalho com diferentes métodos de captura e suportes confere à produção de Ferrez um caráter diverso, que abrange várias transformações técnicas pelas quais a fotografia passou. Somam-se a isso suas experiências, em 1912, com a fotografia colorida em autocromo Lumiére, material que passou a comercializar no Brasil. É nesse período que o fotógrafo refaz em cores algumas de suas vistas estereoscópicas famosas do Rio de Janeiro ‒ iniciadas em negativos de vidro, no final do século XIX. Diferente de boa parte de seus trabalhos comissionados de vistas panorâmicas em preto e branco, que trazem a figura humana apenas como um elemento de escala em paisagens monumentais, ao fotografar em cores, Ferrez trabalha retratos em perspectiva, destacando a figura humana em primeiro plano (Newlands, 2019).

Em seus últimos anos de vida, os autocromos passaram a ocupar uma parte importante nas suas experimentações fotográficas, principalmente durante as viagens, como é possível observar em uma carta ao filho Luciano, de 1915:

Meu bom Luciano,

Nem preciso dizer que me rendi à fotografia em cores. Ela me mantém ocupado. À noite, revelo o trabalho feito durante o dia. Emprestaram-me duas bacias, comprei uma lâmpada elétrica e, com fios adicionais, tenho minha instalação montada. Faço essas baguncinhas no meu quarto e não perturbo ninguém.8

(Burgi et al., 2019, p. 157)

O entusiasmo de Ferrez pelas novas técnicas e pelos processos de produção e comercialização contagiou seus filhos ‒ também fotógrafos e empresários na área de cinema ‒ e netos. Dentre eles, destaca-se o historiador e colecionador Gilberto Ferrez, responsável pela coleção que, a partir de 1998, é incorporada ao acervo do IMS.

Apesar do legado de Ferrez estar estabilizado, a materialidade do acervo continua em descoberta e em fase inicial de conhecimento. Isso inclui a identificação9 dos mais de 1.300 autocromos (Newlands, 2019), em grande parte estereoscópicos. Uma primeira tentativa de sistematização desse material é contemplada através do projeto expositivo e editorial Marc Ferrez: Território e Imagem.

A exposição e o catálogo Marc Ferrez: Território e Imagem

A exposição Marc Ferrez: Território e Imagem esteve em cartaz no IMS, em São Paulo, entre 26 de março e 25 de agosto de 2019, e seguiu itinerante para o Rio de Janeiro, de 7 de dezembro de 2019 a 15 de março de 2020. A mostra dava conta de apresentar os cinquenta anos da produção do fotógrafo em cerca de trezentos itens, entre eles: fotografias e álbuns originais, negativos de vidro, estereoscopias, autocromos, câmeras e equipamentos fotográficos, além de documentos originais e correspondências.

Em visita, durante a abertura da exposição no IMS São Paulo, o curador Sergio Burgi10 afirmou que houve um esforço em garantir que a maior parte das obras expostas fosse original. De maneira que a exposição contava com poucas reproduções de imagens significativas ‒ das quais não foi possível ter originais ‒ e com 5% de cópias feitas por Gilberto Ferrez, entre as décadas de 1940 e 1950.

A proposta curatorial trabalhou com o conceito de território e, com isso, adotou uma organização de viés cartográfico e cronológico, com salas dedicadas a diferentes momentos do contexto histórico da vida do fotógrafo. A sala “Vistas do Rio de Janeiro e Brasil” trazia as imagens do começo da jornada fotográfica de Ferrez, desde o início influenciado por um grupo importante de fotógrafos pioneiros no registro de paisagens brasileiras, tais como Revert Henrique Klumb, Alberto Henschel, entre outros. Nessa sala era possível identificar, encerrados nas vitrines, cartões das vistas estereoscópicas do Rio de Janeiro feitos, por exemplo, por volta de 1861 e 1873, assim como um visor modelo Holmes.

Em “Território em prospecção” estava a importante contribuição imagética de Ferrez quando fez parte da Comissão Geológica do Império, enquanto na sala “Território em expansão” havia os registros sobre a modernização de estradas de ferro no país. Em “Território em transformação” constavam impactantes imagens em grande formato de obras notáveis de engenharia como, por exemplo, das construções de novos sistemas de captação e abastecimento de água. A sala “Imagens em transformação” era ocupada pelas imagens de grandes dimensões feitas por Ferrez a partir de uma câmera Brandon de varredura, que adaptou para fazer fotos panorâmicas de 40 cm de altura por até 110 cm de extensão, em placa úmida de colódio. E também seu último grande trabalho comissionado, o registro da construção da Avenida Central no Rio de Janeiro, que veio a compor um álbum impresso pelos processos fotomecânicos de colotipia e zincografia.

“Novos territórios da imagem” foi a sala que trouxe, pela primeira vez de forma mais abrangente, as imagens em autocromos de Ferrez, com registros mais íntimos de sua vida familiar e viagens. Aqui interessa destacar a parte dedicada à produção de fotografias em cores do fotógrafo, a qual reflete algumas das abordagens adotadas de apresentação ‒ como displays, mídias e formatos ‒ de arquivos estéreos, como visores e autocromos estereoscópicos. Autocromos monoscópicos e estereoscópicos estavam dispostos de maneira conjunta e sobre vitrines de mesas de luz. Essa opção priorizou a visualização do conjunto das placas, em detrimento da proximidade e da apreciação individual de detalhes. Estratégia semelhante foi adotada para a composição de mostradores fechados com diferentes tipos de objetos, como a câmera Nil Melior, usada por Ferrez na captura de pares em placas de autocromos,11 ao lado de outra câmera de fole, que, segundo a legenda, fazia fotos em placas de 10x12 cm.

Outro conjunto contemplou uma caixa de autocromos e um estereoscópio utilizado originalmente para observar as placas, também em vitrine. A impossibilidade de ver em detalhes os autocromos dificultou a compreensão de aspectos do material e dos processos adotados pelo fotógrafo, como a possibilidade de verificar se todos os autocromos estavam encapsulados. Indícios sobre esse processo são encontrados apenas em cartas do fotógrafo para o filho Julio e a sua mulher Claire Ferrez, publicadas por Ceron (2019), nas quais ele comenta sobre a dificuldade que tinha de encontrar materiais (vidros extrafinos) para montar seus pares em autocromos12 no Brasil pós-guerra.

Na exposição, a visão imersiva dos conteúdos era possibilitada por meio de reproduções exibidas em televisor, junto ao uso de óculos 3D, ou em mesas de luz com visores alternativos improvisados (Figura 1). Não foi disponibilizado nenhum modelo de visor original para manipulação do público. Olhar o que antes era contemplado em visores especiais por meio de um televisor muda a fruição. Os visores originais trazem ao espectador um modo imersivo mais concentrado, privativo e livre de distrações e interferências externas.


Figura 1 – Registro da vitrine com os dois visores improvisados para visualização dos autocromos originais de Ferrez e a TV com as versões digitais das fotos estereoscópicas e óculos para fruição da característica 3D dessas imagens. Exposição Marc Ferrez: Território e Imagem. IMS São Paulo, 2019. Foto: Roger Sassaki


Exibir as imagens dos autocromos a partir de reproduções digitais em projetores contemporâneos e propiciar a imersão nos pares estereoscópicos em televisores parece se tratar de uma opção curatorial para aproximar o autocromo de apresentações mais contemporâneas. Em 2019, Burgi comenta, em entrevista para a TV PUC, que a fase em que Ferrez produziu fotos em autocromos foi um momento em que “o mercado amador cresce muito em equipamentos como esse [visor] nas salas de estar das pessoas, elas estão fotografando, produzindo. É o que antecede um pouco a televisão: esse olhar para o mundo”. Completa ainda que “muitos autocromos eram também projetados residencialmente em lanternas mágicas em projeções caseiras, então esses usos que estão aqui reunidos emulam um pouco processos de época” (Articulando, 2019). Nesse caso, a escolha por projeções digitais e individuais dos pares autocromos segue o intuito de contextualização das transformações passadas pela fotografia no período de realização dos autocromos de Ferrez. De acordo com o curador,

o aspecto da apreciação mais imersiva e um pouco mais virtual ‒ seja pela projeção ou seja pela visualização imersiva ‒, também vai trazendo a fotografia nesse aspecto para uma proximidade com a prática contemporânea, que é também mais virtual no sentido que a imagem se desmaterializa, circula eletronicamente pelos monitores, pelas transmissões pelos nossos monitores variados, como celulares e outros, mas ela perde sua materialidade de papel, física. (Articulando, 2019)

No entanto, tal escolha acabou por não privilegiar a estereoscopia, uma vez que as imagens projetadas na parede dessa sala ora aos pares, ora individualmente (Figura 2) colaboraram para o ocultamento do meio e das relações mais diretas entre os autocromos encerrados na caixa, nas vitrines ou mesas de luz.


Figura 2 – Montagem da exposição Marc Ferrez: Território e Imagem no IMS Rio. Foto: Rafael Adorján. Fonte: https://ims.com.br/exposicao/marc-ferrez-territorio-e-imagem-ims-rio/


Além disso, é preciso considerar os efeitos de disparidades representativas com o original quando o assunto é o reconhecimento de objetos estereoscópicos. Situação percebida, por exemplo, com a imagem Claire Poncy Ferrez, Les Marécottes, Suíça, 1915, que na exposição é destacada individualmente na projeção (Figura 2), mas corresponde a um par estereoscópico que, conforme publicado no site13 (Figura 3) e acervo on-line do IMS,14 foi separado, invertido e teve retirada a identificação Marecottes, une suissesse, feita à mão por Ferrez.


Figura 3 – Imagem do par estereoscópico Claire Poncy Ferrez, Les Marécottes, Suíça, 1915, publicada em 2017 no site do IMS. Fonte: https://ims.com.br/2017/07/24/cronologia-marc-ferrez/


Apesar de constarem nas exposições os visores, cartões com pares estereoscópicos, autocromos estereoscópicos, lanternas mágicas e autocromos monoscópicos, não foram destacadas suas características materiais e funcionalidades como mídias. Encerrado em vitrine, o objeto físico original assume um status de relíquia. Depositado num pedestal com cúpula, distancia-se do seu contexto inicial e perde sua centralidade na experiência sensorial.

Outra materialidade assumida pelos autocromos é como imagens impressas, no catálogo homônimo da exposição. A publicação pretende ser a transposição da exposição em forma de livro, no qual os capítulos correspondem às salas expositivas e são acompanhados por artigos de críticos, pesquisadores e teóricos, como Francisco Foot Hardman e Christina Barbosa, e inclui uma breve cronologia do fotógrafo, fruto da pesquisa de Ileana Ceron (2019). O tratamento editorial dado aos autocromos estereoscópicos de Ferrez no catálogo evidencia dois pontos: 1) os processos de produção de versões digitais dos objetos fotográficos originais e sua edição, através de cortes (crops) para reenquadramento dos assuntos e de retoques de coloração e correção das imagens; 2) as descrições técnicas especificadas nas legendas, cujo papel é a identificação dos objetos originais das versões trabalhadas para o catálogo impresso. Sobre o primeiro ponto, destacamos a tendência de separação, inversão, ampliação, limpeza e reenquadramento dos pares estereoscópicos. Um exemplo disso é a imagem estereoscópica de Claire Poncy Ferrez, Les Marécottes, Suíça, 1915, apresentada no catálogo como um autocromo individual de 6x6,2 cm que foi disposto de maneira ampliada ‒ sangrada ‒ na página (Figura 4). Sendo a única aparição da imagem no catálogo, a edição acabou por ocultar aspectos importantes do material, como a vista estereoscópica e os detalhes visuais relacionados ao assunto fotografado e a elementos complementares, como a legenda feita à mão por Ferrez.


Figura 4 – Catálogo Marc Ferrez: Território e imagem, p. 154. A legenda sobre a imagem indica a dimensão de 6x6,2 cm e não menciona se tratar de uma imagem de um par estereoscópico


Ainda a respeito do tratamento editorial das versões para o catálogo, ressaltamos, no segundo ponto, a validação da versão derivada do tratamento digital como representação do objeto original, por meio de legendas sucintas com dados de autoria, data, localização, suporte e acervo. Nestes dados não constam informações sobre o meio estereoscópico, reforçando sua invisibilidade. A ausência dessa informação é mais grave nas imagens publicadas como individuais, as quais, sem pistas de se tratarem na verdade de pares, acabam sendo classificadas em uma lógica monoscópica, isto é, diferente da concepção trabalhada pelo fotógrafo quando as produziu.

O fato de imagens individuais de pares estereoscópicos apresentarem, na legenda do catálogo, a dimensão de 6x6,2 cm e, em outras publicações ‒ como no acervo on-line do IMS ‒, aparecerem como estereoscópicas de 6x13 cm ou 6x12,5 cm, sugere que os demais autocromos individuais com 6x6,2 cm na legenda, provavelmente, apesar de não informado no catálogo e de não localizado o seu par em outras publicações do instituto, fazem parte de uma vista estereoscópica de Ferrez. Fato também passível de dedução se considerarmos que, para fotografar em autocromo, o fotógrafo fez uso de ao menos duas câmeras distintas: uma para placas individuais de aproximadamente 9x7 cm e outra, a câmera Nil Melior, para pares estereoscópicos em placas Lumière de 6x13 cm.

Apesar da publicação contemplar alguns dos pares estereoscópicos, eles aparecem com uma escala diferente das dimensões dos objetos originais ‒ o que, em acréscimo à ausência da descrição sobre sua natureza estéreo e da menção ou oferta de óculos15 apropriados, compromete a possibilidade imersiva dos conteúdos.

Diante desses pontos, observamos que, apesar da exposição e do catálogo Marc Ferrez: Território e Imagem corresponderem a um primeiro momento de difusão do acervo Gilberto Ferrez, problemas relacionados à representação da dimensão estereoscópica da produção de Ferrez já fazem parte do curso de disseminação dessas imagens em ambientes on-line.

O acervo on-line do IMS

O IMS começou a publicar parte de seu acervo on-line a partir de 2004 e 2005. Desde então, tem trabalhado para aprimorar a gestão e a disponibilização de documentos e imagens do seu acervo (Zanatta; Burgi, 2013). Dentre os efeitos desse processo derivam as imagens digitais de autocromos estereoscópicos de Ferrez, que podem ser encontradas de maneira mais dispersa no site e no acervo on-line do instituto e de parceiros nacionais e internacionais. Para que isso fique um pouco mais claro, faz-se de início fundamental comentar um pouco sobre o percurso dessas imagens até o ambiente on-line.

O processamento técnico de fotografias estereoscópicas envolve fases como restauração do original; acondicionamento e preservação; captura por scanner ou câmera fotográfica; tratamento digital; catalogação; pesquisa e revisão (Zanatta; Burgi, 2013). É importante mencionar que não se trata de um caminho linear ou encerrado em si, mas de idas e vindas com revisões, manutenção e atualização das informações sobre os objetos originais e dos documentos gerados nesse percurso. Atuam nessas fases equipes multidisciplinares e técnicos especialistas que, juntamente com tecnologias e softwares, ocupam espaços como a Reserva Técnica Fotográfica, o Núcleo de Digitalização, Tratamento de Imagens e Impressão Digital e o Núcleo de Catalogação e Indexação.

No IMS, a digitalização de objetos fotográficos de natureza translúcida ou reflexiva, como os autocromos de Ferrez, é realizada de maneira individualizada no ponto16 de alta resolução do Núcleo de Digitalização, Tratamento de Imagens e Impressão Digital. Cada sessão segue diretrizes técnicas internacionais com base em ISO17 e guias.18 Desse processo são gerados pelo menos três arquivos: o original RAW, sem cortes, sem ajustes, que visa à preservação digital; o tratado TIFF, com inversões, ajustes de níveis de cores etc.; e o JPEG, oriundo do arquivo tratado. Este último é geralmente destinado ao Núcleo de Catalogação e Indexação para ser inserido no sistema19 do acervo fotográfico e, posteriormente, publicado no site do instituto.

A divisão interna do sistema de catalogação do IMS conta atualmente com as categorias gerais de coleções do acervo; localização dos arquivos digitais; e palavras-chaves. Nesta última localizam-se campos20 padrões de identificação e de classificação das imagens, a partir de assuntos, localidades, personalidades e aspectos formais. É nessa etapa de catalogação que são gerados os metadados administrativos e descritivos sobre o contexto do objeto original, do processamento técnico pelo qual passou e da cópia digital gerada.

Apesar desse processo adotar tipologias, vocabulários controlados e guias internacionais ‒ como o da Dublin Core ‒ objetos estereoscópicos acabam por ser enquadrados em metadados comuns a outros tipos de imagens e não são reconhecidos na produção de informação sobre o objeto. O que repercute, por exemplo, na dificuldade atual de encontro das estereoscopias de Ferrez através da busca no acervo por “estereoscopia”.

Na comparação entre diferentes fichas de pares estereoscópicos ‒ encontradas na busca pelo nome do fotógrafo ‒ o campo “processo” apresenta informações que variam entre Lantern Slide/Prata (Figura 5) ‒ indicativo de uma classificação possivelmente voltada para lanternas mágicas ou projetores ‒ e Autochrome/corante e prata21 ‒ que indicam o tipo de placa fotossensível e os materiais que a compõem, mas não sua natureza estereoscópica. Chama a atenção no topo das fichas a designação padrão em JPEG, que surge como um novo aspecto de identificação do par estereoscópico sem uma descrição ou data do arquivo digital. O que pode conduzir a mal-entendidos entre o objeto fotográfico original e o que é apresentado na página on-line.


Figura 5 – Par estereoscópico Restaurante 1922. Destaque em amarelo para o título e o campo “processo”. Screenshot de tela. Fonte: https://acervos.ims.com.br/portals/#/detailpage/63774


Com relação à construção da identidade desses objetos, é interessante notar que, por uma perspectiva técnica, a extensão JPEG não significa necessariamente imagens produzidas de uma determinada forma, mas “uma categoria de imagens que exibem uma distribuição estética específica (tom contínuo) com a qual o algoritmo JPEG funciona melhor” (Hoelzl; Marie, 2015, p. 3).

A produção de metadados específicos para coleções digitais estereoscópicas tem sido alvo de discussão e de recomendações (Goldberg; Clemons, 2010) no sentido de promoção de descrições mais aproximadas de sua identidade material e seu funcionamento como meio visual. Os metadados permitem a interoperatividade de bancos de imagens e bibliotecas on-line e é por meio deles que se torna possível viabilizar a criação de hiperlinks, referências cruzadas e interpretações múltiplas, com efeitos de ampliação das informações sobre os objetos a que estão relacionados (Navarrete; Owen, 2016). Perspectiva que poderia ser explorada no processo de inserção dos autocromos estereoscópicos de Ferrez em outras bibliotecas nacionais, como a Brasiliana Fotográfica,22 mas que, à semelhança do acervo on-line do IMS, perpetua os limites de busca das imagens por termos específicos e dispõe de fichas descritivas sem a menção da natureza estereoscópica do que está sendo apresentado.

O formato e a funcionalidade de visualização da versão digital no acervo on-line também não explora a possibilidade imersiva do conteúdo visual das imagens. O que poderia ser feito, por exemplo, ao mencionar o uso do visor e/ou oferecer opções em tela através de versões em anáglifos23 ou de animações como wiggles 3d.24 Diante disso, nos questionamos até que ponto a informação visual fornecida pelo efeito tridimensional de um par estereoscópico pode assumir peso nas etapas de digitalização, catalogação e disponibilização on-line. E, de maneira aplicada, quais seriam os efeitos da visualização estereoscópica no processo de identificação e de produção de arquivos digitais e de metadados sobre o objeto fotográfico.

Por uma perspectiva temporal e comparativa entre as aparições dos autocromos estereoscópicos de Ferrez no acervo on-line, no catálogo impresso e em sites, notamos a existência de versões e enquadramentos discursivos variáveis sobre um mesmo objeto fotográfico. Caso, por exemplo, de Morro Dois Irmãos, que foi publicado em diferentes versões individuais no acervo on-line25 e no catálogo26 e aparece como par apenas em matéria jornalística da Revista Zum sobre a cronologia de Ferrez.27 Nos dois primeiros, as datas e dimensões de origem correspondem, respectivamente, a 1912 e 6,0x12,5 cm e 1914-1915 e 6,0x6,2 cm. No último, a data é identificada como 1912, mas sem a referência das dimensões.

Cabe ainda atentar para os limites da manipulação digital dessas imagens, não apenas no que diz respeito às intervenções mais significativas nos conteúdos visuais, mas, no caso das estereoscopias, da decisão de separação dos pares. Conjuntura que pede a reflexão sobre os critérios de escolha de uma imagem individual como representação do objeto original, uma vez que isso, em profundidade, implica a redução visual e existencial da fotografia referente.

Considerações finais

Através do exame dos diferentes projetos envolvidos na propagação dos autocromos de Marc Ferrez, entre eles a exposição, o catálogo e o acervo on-line, foi possível observar os variados processos contemporâneos desencadeados para o tratamento e a publicação de fotografias estereoscópicas de séculos anteriores. É na medida em que essas fotografias se apresentam ao público representadas por diferentes versões e ambientes midiáticos que elas parecem se distanciar de suas especificidades físicas e de seus contextos de visualização originais. Esse fato pode gerar um desconhecimento sobre suas identidades e direcioná-las para uma mesma categoria geral de imagens contemporâneas manipuláveis e digitais. Categoria que, inclusive, reforça uma tendência de enquadramento monoscópico da fotografia.

Vimos também que essa multiplicidade de projetos provocados por autocromos estereoscópicos enfatiza o seu potencial como elemento propulsor para a adaptação e criação de dispositivos, novas representações e experiências. Essa situação ressalta uma construção de identidade desses objetos ao longo do tempo, cujo desafio está em garantir a contiguidade entre as diferentes histórias, representações e publicações que eles assumem. Assim, é cada vez mais fundamental pensar em políticas de processamento técnico que, com atenção ao objeto fotográfico de séculos anteriores, possam estabelecer categorias específicas e estratégias de gestão que propiciem a coerência entre as versões geradas no seu tratamento e disponibilização. Principalmente quando o material fotográfico original se trata do objeto final, como os pares estereoscópicos em chapas de autocromo, que já são positivos diretos.

Por fim, ressaltamos a necessidade de um pensamento e um discurso contemporâneo sobre esses objetos que considere também sua identidade complexa e a história de suas remediações. Isto é, que contemple as especificidades e distinções de suas representações contemporâneas para não incentivar e favorecer um olhar público anacrônico sobre eles.

Referências

ADAMS, G. Um balanço bibliográfico e de fontes da estereoscopia. Anais do Museu Paulista, São Paulo, v. 6/7, p. 207-225, 1999. Disponível em: www.scielo.br/j/anaismp/a/gNfvQH6Kkrw9ZmQPwGNLD8M/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 6 jun. 2021.

ARTICULANDO Exposição: Marc Ferrez: Território e Imagem ‒ 1 e 2. TV PUC, 2019. Disponível em:

https://youtu.be/QTz7S-aDF1E; https://youtu.be/hVT4j3pGR54. Acesso em: 21 jun. 2021.

BATCHEN, G. Negative/positive: a history of photography. New York: Routledge, 2021.

BATCHEN, G. Burning with desire: the conception of photography. Cambridge: MIT Press, 1997.

BOLTER, J. D.; GRUSSIN, R. Remediation: understanding new media. Cambridge: MIT Press, 2000.

BURGI, Sergio; CHIARELLI, Tadeu; BARBOZA, Christina; FOOT HARDMAN, Francisco; NEWLANDS, Mariana; CERON, Ileana Pradilla (org.). Marc Ferrez: Território e Imagem. Catálogo de exposição. São Paulo: IMS, 2019.

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Recebido em 5/12/2022

Aprovado em 3/2/2023


Notas

1    Entre eles, Ileana Ceron, cujo trabalho está referenciado neste artigo.

2    Projeto de ferramenta de mapeamento da cidade do Rio de Janeiro que faz uso de fotografias feitas por Ferrez. Disponível em: https://www.imaginerio.org. Acesso em: 15 jan. 2023.

3    Dentre eles Jonathan Crary, em Techniques of the observer (1992), e Anne Maxwell, em Colonial photography and exhibitions (2000).

4    Jules Richard patenteou uma câmera estéreo chamada Verascope em 1893. Também fabricou estereoscópios giratórios para lâminas de vidro. Esses visores eram todos simplesmente chamados de “Stéréoscope, vues prises avec le Verascope” (Martiné, 2021).

5    Muitos fabricantes de estereoscópios criaram gavetas/reservatórios especiais para autocromos. As placas de autocromos eram reveladas como positivos diretos, cortadas e transpostas para inverter as imagens esquerda e direita, e um segundo vidro era adicionado para dar estabilidade e proteção. Com isso, as lâminas ficavam duas vezes mais grossas. Jules Richard seguiu um caminho mais sofisticado: em vez de cortar autocromos, ele recomendou virar as placas de cabeça para baixo (isso muda as imagens esquerda e direita) e, em seguida, prender prismas nas oculares para desinverter as imagens em seu modelo de estereoscópio Taxiphote Redresseurs. Esse modelo se tornou disponível em 1913 (Martiné, 2021).

6    Marc Ferrez (1843-1923) nasceu no Rio de Janeiro, filho caçula de Alexandrine Caroline e Zéphirin Ferrez, artista francês que imigrou ao Brasil em 1816 para a Missão Artística Francesa. Ao ficar órfão aos sete anos de idade, vai morar na Europa, retornando ao Brasil somente entre 1860 e 1863, período em que possivelmente inicia sua jornada na fotografia. Após ter trabalhado em ateliês com outros fotógrafos, em 1868, já estabelecido, monta seu próprio estúdio no Rio de Janeiro.

7    Em entrevista à Mayna Millen (2019).

8    Les Marécottes, 12 ago. 1915. Arquivo Nacional, FF-LF 2.0.1.2 28.

9    Nesse conjunto há fotos em cores feitas por Marc e também por seus filhos e netos. A atribuição de autoria tem levado em conta cartas e documentos levantados e estudados por Ileana Ceron (2019).

10    Visita guiada com Sergio Burgi à exposição Marc Ferrez: Território e Imagem (Visita, 2019).

11    As estereoscopias em preto e branco feitas em negativos de vidro têm formato diferente. Possivelmente foram registradas com outra câmera que não estava exposta.

12    “tu farás montar o resto em Genebra, não faltarão comerciantes que vendam vidros extrafinos. Antes da guerra, já não encontrávamos tudo o que precisávamos. Agora é pior, não encontramos nada ‒ absolutamente nada ‒, e a preços fabulosos”. E ainda, em carta posterior: “Ele leva um pacote para ti. São algumas dúzias de vistas sobre vidro, em negro ‒ a maior parte está montada. Restam creio que 15 que não estão montadas. Não tive os vidros brancos extrafinos [...]. Para ti será fácil fazê-las montar por algum vendedor de artigos de foto e a um bom preço”. Carta de Marc Ferrez para seu filho Julio, tradução livre de Ileana Ceron (2019, p. 134).

13    Disponível em: https://ims.com.br/2017/07/24/cronologia-marc-ferrez/. Acesso em: 3 abr. 2021.

14    Disponível em: https://acervos.ims.com.br/portals/#/detailpage/23407. Acesso em: 10 jul. 2021.

15    Existem no mercado alguns modelos atuais de óculos criados para auxiliar na visualização dos pares estereoscópicos impressos em livros ou cartões. Os visores The OWL Stereoscopic Viewer e The Lite Owl, criados por Brian May, da London Stereo Company, e os visores Stereoscope Mk III e Lorgnette Viewer, criados por Bill Hibbert, da Design for Life, são exemplos desses modelos contemporâneos.

16    Segundo Mariana Newlands, coordenadora do Núcleo de Digitalização, Tratamento de Imagens e Impressão Digital, o IMS conta com diferentes pontos de trabalho de digitalização, os quais atendem demandas de projetos editoriais e expositivos (como a exposição e o catálogo de Ferrez), e também do banco de acervos e da difusão on-line.

17    Especificamente a Photography Archiving Systems Image Quality Analysis: Part 1: Reflective originals (2017).

18    Os principais são Metamorfose Preservation Imaging Guidelines (2012) e Federal Agencies Digital Guidelines Initiative ‒ Fadgi (2016).

19    O IMS faz uso do software alemão Cumulus, de gerenciamento de conteúdos digitais. A ferramenta é customizável.

20    Em torno de 34 campos, sendo alguns deles: título no original local; data; informações de fonte primária; sobre a coleção; sobre o autor; designação genérica; processo formador da imagem; dimensão; estado de conservação; características de deterioração; e informações sobre reprodução e original reproduzido (Zanatta; Burgi, 2013). Para a publicação on-line, apenas alguns desses campos são oferecidos para pesquisa: área, arquivo/coleção, autoria, referências de autoria conhecidas, título, local, data, município, estado, país, sobre o autor, designação genérica, processo, dimensão e cromia.

21    Ver como exemplo a ficha on-line do par estereoscópico Jardim Botânico, disponível em: https://acervos.ims.com.br/portals/#/detailpage/23409. Acesso em: 24 jun. 2021.

22    Ver, por exemplo, a disposição do par Restaurante 1922 em: http://brasilianafotografica.bn.gov.br/brasiliana/handle/20.500.12156.1/5716. Acesso em: 5 jun. 21.

23    Par de imagens estereoscópicas sobrepostas, uma em tom de ciano e outra em vermelho, para serem vistas com óculos com uma lente ciano e outra vermelha.

24    Wiggle 3d é uma espécie de animação em que as duas fotos de um par estereoscópico são vistas em sequência e alternadamente, de modo a oscilar repetidamente. Por conta da persistência da visão, oferece a sensação de tridimensionalidade sem a necessidade do uso de óculos especiais.

25    Disponível em: https://acervos.ims.com.br/portals/#/detailpage/23406. Acesso em: 27 maio 2021. No descritivo, constam as dimensões de 6x12,5 cm e a data de 1912.

26    Disponível no catálogo da exposição Marc Ferrez: Território e Imagem (p. 122). No descritivo da imagem constam as dimensões de 6x6,2 cm e a data de cerca de 1914-1915.

27    Disponível na matéria jornalística da Revista Zum em: https://revistazum.com.br/radar/cronologia-marc-ferrez. Acesso em: 27 maio 2021. Na legenda da imagem consta a data de 1912.



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